Juremir Machado da Silva

Lógica do assentimento

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Lógica do assentimento Juremir (esq.) e Michel Maffesoli, Doutor Honoris Causa da PUCRS | Foto: Divulgação PUCRS

Luana Chinazzo, minha orientanda de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUCRS, voltou recentemente de Montpellier, na França, onde estava fazendo parte da sua formação, o que na linguagem universitária se chama de “cotutela com dupla diplomação”. É aluna, ao mesmo tempo, da PUCRS e da Universidade Paul Valéry, Montpellier III. Vai defender uma tese e receber dois diplomas. Um de cada universidade. Ela me trouxe de lembrança o mais recente livro de Michel Maffesoli, Lógica do assentimento. Autografado pelo mestre. Li, como se diz, tudo de uma sentada só.

É Maffesoli na veia. Uma vez, num avião, encontrei um velho professor universitário gaúcho, que me tratou com suave condescendência: “Como vai? Ainda com esse Maffesoli”. Sorri. Nunca soube ser descortês com os mais velhos. Poderia, ou deveria, ter-lhe dito que considero Maffesoli espetacular, extraordinário, preciso. A sua capacidade de compreender o que mobiliza as pessoas na vida é impressionante. Quando levei Maffesoli para conhecer o acampamento farroupilha, em Porto Alegre, ele me disse o que eu imaginava: “Há uma incrível vibração compartilhada aqui”. A força do mito. Faz viver. Está ótimo. O desejo de pertencimento move montanhas e histórias.

Lógica do assentimento retoma o que me apaixonou no primeiro livro de Michel Maffesoli que li, no final de 1984, A conquista do presente: a importância de dizer sim à vida apesar de todos os pesares. Nunca deixar para o futuro radioso ou utópico a experiência existencial intensa. Não cair na conversa dos que prometem a felicidade amanhã quando se pode vibrar e gozar aqui e agora. Há nesse presenteismo radical uma defesa vigorosa da sabedoria popular cotidiana. Viver é perigoso e não se pode correr o risco de deixar para depois o que só pode ser gozado, como der, imediatamente.

Um parágrafo desse novo e profundo livro de Michel Maffesoli diz tudo: “É bem sobre essa recusa fundamental que vão ser elaborados, na esteira da filosofia da História, própria ao século XIX, o progressismo desenraizado e a pretensão arrogante ao saber absoluto. Como bem pretendia Hegel, ‘o povo ignora o que ele quer, só o Príncipe é que sabe’. É nessa filiação que se situa uma intelectualidade pouco conectada com a vida real e, tomando esse termo no seu sentido mais forte, cada vez mais abstrata”. Em outras palavras, os condutores do povo ao paraíso trataram de viver até o talo enquanto pregavam aos habitantes do “andar de baixo” que se sacrificassem pelo futuro.

Sábio, o povo sempre acendeu uma vela para cada santo. Muito trabalho, muita fé e muita festa quando a ocasião se apresenta. Afinal, da vida nada se leva e hoje eu vou me acabar de tanto dançar. Maffesoli insiste que não se vive socialmente sem memória, passado, mitos, ritos, tradições, inovações e movimento. Tecnologia de ponta e arcaicos unidos. Tudo isso serve de “cola” à sociedade. Algo que explica com um dos seus oximoros preferidos: “enraizamento dinâmico”.

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