Juremir Machado da Silva

Não há Bolsonaro que dure para sempre

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Não há Bolsonaro que dure para sempre Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

O Brasil está acéfalo. Lula é o presidente eleito. Ainda não manda. Jair Bolsonaro, o presidente no posto, desistiu de governar. Dedica-se agora a chorar em cerimônias militares. O imbrochável chorão. Enquanto isso, o país anda a deriva. A Capes, agência responsável por parte das bolsas para mestrandos e doutorandos do país, não tem dinheiro para cumprir seus compromissos. As universidades públicas estão no desespero. Neste terça-feira, a Capes anunciou que deixaria seus bolsistas a ver navios em pleno final de ano. Não receber a bolsa, cujo valor está defasado, é o caos. Como pagar as contas, comer, tocar a pesquisa?

Esse é mais um retrato do Brasil de Bolsonaro. Certamente é uma vingança contra o meio universitário, que se mobilizou contra o negacionismo e o obscurantismo do capitão e da sua tropa. Bolsonaro não perdoa, chora. E pune. Ah, não quiseram votar nele, então vão ver só. O bolsonarismo, ideologia de extrema direita, armamentista e militarista, odeia intelectuais, livros, debate de ideias, diversidade, tudo aquilo que resulta em pensamento crítico, liberdade de escolha e cultura.

Depois de mobilizar mundos e fundos, especialmente fundos, para tentar se reeleger, inventando um Estado de emergência para passar por cima da legislação eleitoral e das limitações impostas por ela em ano de pleito, Bolsonaro deixou simplesmente o caixa do Ministério da Educação secar sob a alegação de que é preciso respeitar o teto de gastos. Se pagou e não levou, o presidente dá o troco. Se acredita que não existe voto grátis, fecha a torneira de recursos de quem não votou nele.

Para quem se queixar? Bolsonaro não ouve, não fala, não vê e não está nem aí. Estando. Curte o desespero alheio com seu sadismo corriqueiro, o mesmo que lhe permitiu zombar da dor alheia durante a pandemia. O Brasil não chora por Bolsonaro, salvo diante dos quartéis, onde se pede golpe em nome da democracia. Bolsonaro só chora por si mesmo. Desconhece a palavra empatia. Chora por si e pelos seus, temeroso de que, sem foro privilegiado, o braço flexível da lei possa alcançá-lo. Enquanto espera, mergulhado na depressão, curte o sofrimento que ainda consegue provocar entre os que mais odeia, intelectuais e cientistas.

Sempre que ouve falar em cultura, ciência, pensamento, intelectuais, ideias, Bolsonaro saca o seu ressentimento. Até o último minuto do seu mandato ele se manterá em posição de negação, impávido diante do iluminismo. Que estudantes fiquem sem suas bolsas não lhe tira o sono, que deve andar escasso por causa de suas ilusões demolidas. Acabou-se o que era doce para ele e amargo para milhões. Pela fresta do poder perdido, o desolado quase ex-presidente saliva diante da última dor que pode infligir aos seus desafetos, pois para ele as generalizações são normais e a universidade é um espaço de comunistas, ateus e pervertidos.

Esse pesadelo também passará. Não há Bolsonaro que dure para sempre. Deixará marcas profundas. Parece que Bolsonaro quer saborear esse último gostinho de perversão. Dezembro será um mês longo. Ninguém escreve ao capitão pedindo para ele ficar. O golpe que ele sonhou virou fake news.

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