Juremir Machado da Silva

Pacote de final de ano para a educação

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Pacote de final de ano para a educação Helenir Schürer, presidente do CPERS

O governo de Eduardo Leite fez tramitar na Assembleia Legislativa a passo de ganso um pacote de mudanças para a educação. Foi um rolo compressor. Vai da alteração no processo de eleição das direções das escolas à municipalização do ensino fundamental. Conversei com Helenir Schürer, presidente do CPERS-Sindicato, sobre o que já foi aprovado e sobre o que ainda poderá vir. Se a secretária de Educação do Rio Grande do Sul estiver disponível, apresentarei o seu ponto de vista em outra coluna. Helenir destaca que o governo, com a maioria que possui no parlamento estadual, aprova o que quiser e do jeito que quiser, sem discussão com a sociedade.

Mais precisamente, sem discussão com as partes diretamente afetadas. Segundo ela, a Assembleia Legislativa promoveu encontros em sete regiões sem convidar o CPERS, sem avisar com boa antecedência os envolvidos e sem liberar o ponto para que professores pudessem participar. Foi, como diz a galera, um “apareçam lá” sem dar o endereço. Entre os pontos sensíveis ainda em aberto está a possibilidade de criação de escolas privadas ou públicas de ensino fundamental incompleto, alterando o dispositivo atual: “Fica barato abrir, por exemplo, só primeiro e segundo anos, e é um prato para projetos de doutrinação em tempos de fanatismo como o nosso”, observa Helenir.

Na municipalização total do ensino fundamental, Helenir vê uma ilusão: o Estado repassa para municípios parte das suas responsabilidades atuais, faz economias de folha de pagamento e entrega para quem já não cumpre a sua parte ou nem tem orçamento para isso a obrigação de bancar educação de qualidade. Municípios, conforme Helenir, encantam-se com a possibilidade de receber recursos para isso, que virão do Fundeb, da União. Só que a mágica não se consumaria no decorrer do tempo. Mato Grosso do Sul teria feito tal movimento e se arrependido. O dinheiro não dá conta do necessário e os municípios ficam sobrecarregados. A médio prazo, o problema fica mais grave.

Eleições nas escolas

Já aprovada, a nova regra de eleição das direções das escolas, conforme Helenir Schürer, submete inteiramente as candidaturas aos interesses do governo de plantão, tirando autonomia da comunidade escolar. O Plano de Ação, discutido e aprovado pela comunidade (docentes, pais), passa a só ter validade se ratificado pela Secretaria Estadual de Educação. Assim, posições e candidaturas divergentes ficarão pelo caminho, com seus signatários impedidos de concorrer: “O processo democrático fica comprometido”, diz Helenir. “Todo o processo fica controlado pelo governo”.

Paradoxalmente, depois, ainda segundo Helenir, “de arrochar os salários” o governo passa a falar em “valorização do plano de carreira do magistério estadual”. Noutro passe de mágica, o que estava ruim fica bom. Sem terem realmente sido ouvidos os professores entram numa suposta nova realidade de entendimento e melhoria, com uma hipertrofia do executivo na definição de procedimentos que normalmente resultado de construção compartilhada. A educação constitucionalmente deve ser o produto das interações entre os atores sociais atingidos, ou seja, a sociedade.

Conselho estadual de Educação

Helenir Schürer lamenta também a alteração dos parâmetros de constituição do Conselho Estadual de Educação. O governo indicava sete membros sobre 22. Com a nova regra, passará a indicar 14 sobre 28: “Teria sido mais sincero dizer que gostaria de acabar com o Conselho. A partir de agora bastará que o governo consiga eleger alguém para ter maioria absoluta. Além disso, qualquer decisão do Conselho só terá validade se referendada pela Secretaria de Educação”, explica Helenir. Na prática, o governo perde autonomia, fica a reboque do governo, passa a ser extensão do executivo.

Vale destacar que o Conselho de Educação tem funções consultiva, ficalizadora e deliberativa. Como deliberar tendo a decisão de ser autorizada pelo governo? Essa é a indagação de professores e de muitos que se inquietam com as alterações. O governo evidentemente fala em modernização. Em princípio, para dar agilidade aos processos e possibilidade aos gestores de colocar em prática projetos que entendem fundamentais.

Meritocracia

Outro tema controvertido é o da valorização da meritocracia escolar.

O governo quer premiar escolas com melhor rendimento.

Helenir Schürer vê nessa medida uma distorção.

Ela cita o caso de uma escola na Restinga, em Porto Alegre, que teve a fiação elétrica roubada e até o portão levado. Nada escapa: “Essa escola não terá o mesmo rendimento que o Instituto de Educação. São condições diferentes, contextos desiguais, o que exige abordagem diferenciada”. Para a presidente do CPERS, deve receber mais ajuda financeira quem mais precisa, não quem já tem bom desempenho e boas condições de trabalho e atuação.

O que favorece mais o bom desempenho escolar: cooperação ou competição? Acentuar a distância entre mais e menos aquinhoados? Estabelecer planos de apoio complementar aos estabelecimentos mais vulneráveis ou acentuar as disputas e enfrentamentos? Pode parecer implicância, mas são perguntas que surgem na cabeça de qualquer um diante de assunto tão relevante. Ou o leitor discorda? Helenir brinca: “As votações davam sempre 38 a 14. O 38 é coelho. O governo tirou um coelho da cartola”.

O futuro dirá que bicho sairá disso tudo.

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