Juremir Machado da Silva

Presidente Javier Guedes Trump Mileinaro

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Presidente Javier Guedes Trump Mileinaro Foto: Theo Tajes

Recebi uma carta de um brasileiro que vive em Buenos Aires, onde tenta descobrir os subúrbios da cidade descritos por Borges nos seus contos:

“Dediquei meus últimos tempos a estudar esse personagem inusitado que é Javier Milei, presidente eleito da Argentina. Num país dividido entre peronistas de direita, peronistas de centro, peronistas de esquerda, peronistas revolucionários, peronistas nostálgicos, peronistas neoliberais e quase peronistas, Javier Milei é um produto do peronismo em sua versão antiperonista. O eleitor escolhe, em qualquer lugar, por erro e acerto. Se erra com um lado, escolhe o outro, salvo os ideológicos, que preferem errar sempre com o mesmo por considerar que há acerto no erro e ponto final.

Descobri o óbvio militante: Javier Milei é Jair Bolsonaro e Paulo Guedes na mesma pessoa. Sem a farda. Mas com a benção dos militares. Uma economia de meios gigantesca. Milei tem a fantástica capacidade de Bolsonaro para dizer absurdos e a arrogância de Guedes em termos de economia e de horror ao papel do Estado, exceto certamente quando necessário para salvar o mercado de alguma crise. A sua vantagem em relação ao capitão brasileiro é não precisar de Posto Ipiranga. Ele é o seu próprio Posto Ipiranga. Há quem pense até que Milei é mais do que isso: Bolsonaro, Guedes e Donald Trump ao mesmo tempo. É pouco provável. Falta-lhe, porém, a grana do americano.

A esquerda argentina abusou da inteligência dos eleitores. Queria que votassem para salvar o país no ministro da economia que ajudou a quebrar a nação. Era como pedir ao torturado que votasse no torturador por medo do pior. Se Sergio Massa não conseguiu segurar a inflação comandando a Fazenda, por que o faria com a faixa presidencial no peito? De certo modo, Massa e os seus amigos só tinham dois argumentos a oferecer: nós somos melhores do que eles e nós somos bons e o bem, eles são maus. Mesmo que, por hipótese, estivesse correto, parece pouco para derrubar uma inflação de 143%.

Bem pensado, Milei, em se tratando de bizarrices e disparates, bate facilmente Bolsonaro. Se o brasileiro queria dar cloroquina às emas para enfrentar a covid-19 e chegou a mostrar-lhes uma caixa do medicamento, o argentino se aconselha com o seu cachorro morto. Filosofias zoológicas. Milei e Bolsonaro têm a pegada das redes sociais. Não argumentam, fuzilam. Não dialogam, detonam. Não informam, deformam. Eleito, Milei despertou o bolsonarismo nocauteado no Brasil pelos efeitos do 8 de janeiro. O Brasil que se prepare para o velho efeito Orloff, aquela da propaganda vodca ruim: eu sou você amanhã. A Argentina pode ter ressaca retrospectiva em comparação ao Brasil: eu sou você ontem. Não é pouco. Um Bolsonaro incomodou muito gente. Fundido com Guedes, é uma manada de elefantes na loja de cristais.

Há quem pense que Milei até pode não ir mal em economia. Dificilmente, porém, irá bem no resto, especialmente em temas comportamentais. Se for de fato um libertariano, anarquista de direita ou de extrema direita, deverá rechaçar o Estado em qualquer dimensão. Os liberais conservadores querem o Estado longe dos negócios, salvo para empréstimos a juros baixos, e perto de tudo que cheire a costumes, interferindo mais na cama das pessoas do que nas suas finanças. Se Massa tiver paciência, poderá ser eleito na próxima vez.

Eleito, Milei tenta mostrar-se mais razoável. Restar saber até onde vai a razoabilidade em alguém que se aconselha com o fantasma do seu pet.

Saludos, pero que si, pero que no…”

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