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Escola sem (o teu) partido

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Escola sem (o teu) partido Foto: MChe Lee/Unsplash

Passados quase 10 dias do ataque que matou quatro crianças em uma creche de Blumenau (SC) no dia 5, o choque cedeu lugar ao pânico. E, vocês sabem, o pânico é terreno fértil para medidas autoritárias.

Grupos de pais e mães no WhatsApp viraram alvo ainda mais fácil para a desinformação – e mais terror, com áudios e correntes anunciando novos ataques. Na escola do meu filho, uma mãe sugeriu que pais com flexibilidade de horário passassem o dia em frente à escola até que a direção reforçasse a segurança no seu entorno.

O medo é totalmente compreensível. Mas não é só de pais e mães aterrorizados que partiram ideias, no mínimo, questionáveis. Na terça-feira, o prefeito Sebastião Melo editou um decreto que restringiu o acesso de parlamentares e movimentos estudantis a escolas da rede municipal, como mostramos nesta reportagem. Agora, a presença de pessoas de fora da comunidade escolar para aulas e palestras precisa ser autorizada pela Secretaria Municipal de Educação (Smed).

Na nota enviada ao repórter Matheus Beck, a Smed apoia-se na necessidade de reforço na segurança das escolas para justificar uma decisão que lembra o projeto Escola sem Partido – aquela iniciativa que, no fundo, no fundo, sempre foi sobre proibir certas ideologias (a dos outros) em detrimento das suas.

“Não há proibição e, sim, regra para que haja alinhamento das diretrizes pedagógicas e se restrinjam iniciativas ideológicas de qualquer natureza política. O objetivo é que as escolas sejam ambientes de respeito à pluralidade, à diversidade cultural e à liberdade de ideias”, diz a nota, que expõe uma falta de compreensão do significado de ideologia e parece até criminalizar a política.

Além disso, evidencia uma confusão entre o que a gestão de Melo considera pluralismo com o que é de fato um espaço livre para o debate de ideias. Em junho do ano passado, o prefeito sancionou uma lei que vetou o uso de linguagem inclusiva nas escolas, em mais uma demonstração de interferência na sua autonomia. 

Professores armados

No legislativo, parlamentares foram ainda mais longe. Antes do decreto do Executivo, no dia do ataque ocorrido no estado vizinho, vereadores de Porto Alegre aproveitavam o fato para defender a pauta armamentista. Fernanda Barth, talvez a mais bolsonarista das parlamentares da Casa, sugeriu que os professores andassem armados nas escolas.

Agora uma pergunta para a Smed: a iniciativa da vereadora é “de natureza política”? É uma pauta “ideológica”?

Polícia para quem precisa

Mensagem que recebi de uma mãe ontem: 

Há meses (e hoje mesmo) em frente ao Pan American School SEMPRE tem Brigada Militar, de manhã e de tarde, mesmo antes dos ataques. Sendo que a escola tem seguranças privados. Em compensação, a poucas quadras de distância, o colégio Estadual Florinda Tubino, onde o meu filho estuda, a BM diz que não tem policial para ficar o dia todo. Sendo que o Tubino deve ter muuuuito mais aluno que o Pan American. 

E aí, governador Eduardo Leite, como explicar essa situação? E mais: o anúncio desta semana, sobre o efetivo dobrado nas escolas, vai dar conta? 

Sem mais perguntas. Por hoje.


Marcela Donini é editora-chefe do Matinal. Tem medo que o Brasil se torne os EUA, onde os ataques às escolas são cotidianos e o porte de armas é um direito fundamental.
Contato: [email protected]

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