Reportagem

Chapa derrotada para o conselho do Plano Diretor teve forte apoio da base de Melo

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Chapa derrotada para o conselho do Plano Diretor teve forte apoio da base de Melo Eleição da região central teve filas de até 5 horas para votar | Foto: Tiago Medina

Era a Câmara Municipal, a casa do povo. Mas, na noite da última terça-feira, parecia que era um estádio de futebol, tamanho foi o acirramento entre os dois lados envolvidos na disputa pelo assento de conselheiro da Região de Planejamento e Gestão 1 de Porto Alegre. Como num bom Gre-Nal, a gana e o esforço para a vitória eram altos. A frustação em caso de derrota, também – e essa acabou no colo do prefeito Sebastião Melo (MDB). 

Em meio à longa fila que se formou entre as seis urnas de votação – que por um bom tempo ficou próximo ao portão da rua da sede do legislativo – estiveram pelo menos quatro integrantes do primeiro escalão municipal, assim como assessores em cargo de comissão. Entre eles, os titulares da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos, Marcos Felipi Garcia, e o de Mobilidade, Adão Castro Júnior, tiraram fotos manifestando apoio à chapa 2, encabeçada pelo empresário e corretor de imóveis Kleber Sobrinho e que levou a pior na eleição ao alcançar 40% dos votos, ante 60% do advogado e militante social Felisberto Luisi. 

Sobrinho contou ainda com apoio explícito de vereadores da base governista. Jessé Sangalli (Cidadania), Ramiro Rosário (PSDB) e Márcio Bins Ely (PDT) pediram votos por Sobrinho ou “contra a esquerda” em suas redes sociais. Filho do prefeito, Pablo Melo (MDB) circulou com adesivo da chapa derrotada no peito durante a votação. 

“Chapa 2” x “Fora Melo”

Conforme reportado pela Matinal, o clima ao longo da noite da eleição de terça esquentou algumas vezes, com direito a gritos de torcida. Em algumas oportunidades, um “fora Melo” foi ecoado nos corredores do legislativo. A resposta, um tanto menor, chegou por meio de vaias. Em determinado momento, a vaia foi trocada por gritos de “fora Lula”. 

E meio a essa polarização, ao contrário dos colegas de direita, foram poucos os vereadores de oposição encontrados pela reportagem nos corredores da Câmara. Tampouco foram registrados adesivos “chapa 1” entre os eleitores. Havia, sim, adesivos de “Fora Melo”, com uma discreta menção ao nome do vereador Jonas Reis, do PT. 

“Não quero que Porto Alegre vire uma Camboriú”

Uma das eleitoras que estampava o adesivo era a professora aposentada Marivaine Alencastro. Ela conversou com a Matinal após votar, passadas cerca de duas horas desde que tinha chegado à Câmara. Ainda que a participação na eleição fosse voluntária, ela disse que fez questão de participar do processo: “Eu queria, com toda a convicção, votar numa pessoa que se preocupa com o meio ambiente e que visse a cidade de uma forma mais humana”. 

Outro ponto que a fez sair de casa e votar pela primeira vez no CMDUA foi o avanço do mercado imobiliário: “Não quero que a minha Porto Alegre vire uma Camboriú, porque me parece que o prefeito atual se inspira nessas cidades para transformar a nossa capital numa outra cidade que não é. Queremos a nossa identidade, própria, da nossa Redenção, do nosso Parque Harmonia como eles são. Não precisa asfaltar, botar edifícios, nem nada”. 

O tensionamento com a questão imobiliária na Casa foi latente. O setor é um dos mais próximos do prefeito Sebastião Melo desde a sua campanha em 2020, quando agentes deste mercado se tornaram seus principais doadores. Eleito, a gestão Melo articulou e conseguiu aprovação de dois grandes projetos urbanísticos específicos, enquanto a revisão do Plano Diretor vem sofrendo constantes atrasos – era para estar concluída em 2020 e pode ficar para 2025. Sob Melo, áreas como o 4º Distrito e o Centro ganharam regimes próprios, em medidas que fomentam reformas e construção de prédios mais altos. 

A altura dos futuros prédios de Porto Alegre é um dos principais pontos de divergência entre o município e urbanistas. Ao mesmo tempo, de acordo com o Censo, a cidade vem acumulando um estoque maior de imóveis vazios – eram mais de 100 mil unidades vagas em 2022.  

Recorde de participação

No campo oposto ao da professora Marivaine, uma eleitora que identificou-se apenas como Adriana. Adesivada com a chapa 2, ela saía apressada da Câmara quando foi abordada pela Matinal, após quase duas horas de espera para votar. Foi sucinta ao explicar por que estava lá: “Eu vim, porque eu quis e acho importante”, respondeu. 

Perto de 22h, quando algumas pessoas já estavam desistindo de votar por conta da longa espera, uma funcionária da Cootravipa, que seguia firme na fila, contava sua história: varre diariamente cerca de três quilômetros na avenida Bento Gonçalves, faça chuva, faça sol. É cansativo, mas estava ali para apoiar a chapa 2. Não necessariamente por Kleber Sobrinho, mas por um de seus suplentes. “Ele é um líder na nossa comunidade, então estamos aqui para dar o nosso apoio”, contou. 

Apesar de não ser obrigatória, a votação desta terça mobilizou um número recorde de mais de 1,5 mil pessoas. Nesta eleição para o Conselho, a prefeitura permitiu que o cidadão optasse por votar em seu “domicílio profissional”, escolhendo, então, um representante no CMDUA que debata obras de impacto perto de seu trabalho e não de sua residência. Ainda que esteja no edital, a medida é questionada e, conforme o ex-prefeito Raul Pont, abre precedente para imbróglios judiciais.

Próxima disputa será na área do 4º Distrito

A eleição será retomada nesta quinta-feira, na RGP 2, que engloba os bairros Farrapos, Humaitá, Navegantes, São Geraldo, Anchieta, São João, Santa Maria Goretti, Higienópolis, Boa Vista, Passo D’Areia, Jardim São Pedro, Jardim Floresta, Cristo Redentor, Jardim  Lindóia, São Sebastião, Vila Ipiranga, Jardim Itú, Jardim Europa, Sarandi e Arquipélago. Parte da região integra o 4º Distrito, outra área que recebeu um regime urbanístico próprio da prefeitura – ampliado recentemente.

A votação ocorrerá na EMEF Antonio Giudice, no bairro Humaitá. O horário de votação permanecerá o mesmo, entre 18h e 20h, apesar da possibilidade de extensão ventilada na terça. O que aumentará é o número de urnas disponíveis, de seis para 12.


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