Crônica

Longe no tempo e no espaço

Change Size Text
Longe no tempo e no espaço Estaleiro pra lá do Guaíba, 2000. Ilustração: Edgar Vasques

*Diversas imagens de Edgar Vasques homenageiam Porto Alegre na edição 67 da Parêntese. Você pode ver o ensaio gráfico completo na seção cartum. 

Saudade, essa “emoção diferente” (apud Chocolate e Elano de Paula), não tem sido meu negócio. Já foi. Não é mais. De volta à terapia depois de vinte anos por causa desse horror iniciado em março de 2020, estou com as juntas – emocionais – moídas de tanta flexão. Abaixar dói ainda mais. Virar a cabeça, então, me provoca torcicolo.

Mas claro que às vezes bate aquela sensação que, ó graças a deus, só conseguimos expressar com a nossa língua portuguesa (…). Umas coisas que acabam ficando encruadas no fundo lá de algum pedaço da gente. Duas décadas longe de Porto Alegre agora este ano, há certas coisas do passado que resistem e ficam tamborilando entre o coração e a têmpora. 

Pegar o Campus-Vale na Protásio com Vicente da Fontoura e passar a próxima hora e meia pensando em poesia (Baudelaire, os simbolistas) enquanto da janela a cidade se transforma, meio serpenteante, na passagem entre a Antônio de Carvalho e a Bento Gonçalves. 

Comprar revistinha nos Bons Amigos, também na Protásio, ouvindo os adultos falarem que 1982 vai ser melhor porque vai ter Copa do Mundo na Espanha.

A torrente (Tourette?) de trocadilhos num bar da Cidade Baixa com Prego e Fábio.

A caminhada veloz e embriagada, e com muito medo, entre o Ocidente e a Bela Vista em madrugadas da metade dos 1990s. Dez anos depois voltei com minha mulher, então namorada, para a João Telles, e o taxista me avisou: “Desce e já entra rápido porque aqui tão roubando os magrão”.

Um balaio da Feira do Livro em 1991. As idas semanais à Martins Livreiro na esperança de encontrar a antologia de Borges/Bioy sobre a gauchesca. (Achei no Messias, já em SP.)

Minha petulância de estagiário na Coordenação do Livro da SMC me enche de vergonha e saudade.

A última vez que fui ao Elo Perdido sem saber que era a última vez.

Há decerto mais coisas. Sei que há. Mas não ando querendo forçar a barra. Essa ginástica toda me bota comovido como o diabo.


Leandro Sarmatz é escritor e editor da Todavia

RELACIONADAS
ASSINE O PLANO ANUAL E GANHE UM EXEMPLAR DA PARÊNTESE TRI 1
ASSINE O PLANO ANUAL E GANHE UM EXEMPLAR DA PARÊNTESE TRI 1

Esqueceu sua senha?

ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.
ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.