Entrevista

“O que não tem censura – nem nunca terá”: entrevista com Márcio Pinheiro

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“O que não tem censura – nem nunca terá”: entrevista com Márcio Pinheiro

O jornalista Márcio Pinheiro está lançando um belo e aprazado livro – O que não tem censura – nem nunca terá, com o subtítulo “Chico Buarque e a repressão artística durante a ditadura militar”, pela editora L&PM. Belo porque dá conta do serviço adequadamente, num texto fluente e muito bem informado; aprazado porque Chico está completando 80 anos neste 2024. 

Propusemos umas questões para o Márcio, querendo com isso celebrar o lançamento e convidar o leitor a entrar nos bastidores da produção do livro. 


Luís Augusto Fischer – De onde surgiu a ideia do livro? Os 80 anos do Chico te motivaram?

Márcio Pinheiro – Esse livro – de certa maneira – é uma “continuação” do Rato de Redação (editora Matrix, de São Paulo), meu livro anterior, em especial por repetir o meu interesse pelo período da vida brasileira que vai do final dos anos 60 à metade dos anos 80. Cada vez me convenço mais que a década de 70 – meio que perdida ali entre as tão exaltadas décadas de 60 e 80 – foi um período interessantíssimo ainda pouco explorado. É uma década subestimada. Além disso, Chico era uma obsessão intelectual mais antiga do que o Pasquim. E, ao me dar conta que ele completaria 80 anos em 2024, fiquei com a certeza de que era uma ótima data para juntar dois desses meus interesses: o personagem e o período. Assim, me pareceu natural escrever sobre ele – faltava achar um foco, já que uma biografia completa de um personagem vivo e ativo me parecia ser impossível de ser feita nesse momento e nessas condições. Dessa maneira, optei por fazer um recorte que, aproximadamente, vai de 1966 a 1989 tratando a ideia central de que Chico foi o artista brasileiro mais visado pela Censura – e de como ele soube enfrentá-la com inteligência e criatividade.
 

Quanto tempo de produção, entre pesquisa, redação e edição?

Grosso modo, um ano. Comecei a pensar em dar os primeiros tratos à bola em meados do ano passado. Aí comecei a ler as reportagens e a revirar os arquivos. Creio que li mais de 700 páginas de jornal. Além disso, li (ou reli) muitos livros sobre ele, e também sobre os festivais, sobre a política, sobre a contracultura e sobre o Brasil dos anos 70. E também reouvi com igual prazer todos os discos do período, não apenas os dele, mas de alguns contemporâneos que também são lembrados no livro como Edu Lobo, Vinicius de Moraes, Geraldo Vandré, Wilson Simonal, Jards Macalé, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jorge Ben, Milton Nascimento, João do Vale, MPB4.

O Chico é teu cancionista predileto? Ou está entre os 3 mais?

Sim. Me atrevendo a fazer uma dupla análise, digo que o Chico entra em qualquer lista minha fosse qual fosse o critério. Se fosse chamado a fazer uma análise distanciada e me pedissem para citar os cinco maiores compositores da música brasileira, não teria dúvida em dizer que da primeira metade do século 20, eu destacaria Noel Rosa e Ary Barroso, e da segunda, Tom Jobim e Chico Buarque. O quinto é quem você quiser!

Já se fosse uma lista mais pessoal, colocaria o Chico entre os três mais. Aliás, até colocaria o Chico numa lista pessoal de compositores mundiais. E como gosto muito de listas poderia até fazer outras mais envolvendo o músico e suas composições. 

Chico faz parte da minha formação desde os dez anos (o tempo de Meus Caros Amigos) e desde então nunca deixei de ouvir com atenção tudo o que ele disse. Fosse em músicas, fosse em entrevistas.

E as fontes de pesquisa, quais foram? Houve algum embaraço no processo?

Nenhum embaraço. Pesquisei em jornais, revistas, arquivos, depoimentos, livros. Como te disse, li muito material escrito – e, desde o início, era essa a minha intenção. Como não seria possível falar com o próprio Chico acreditei que não valeria ir atrás de outros entrevistados. E não me decepcionei: estava tudo lá, nos jornais e nos arquivos. É bom lembrar que o Chico era figurinha fácil nos anos 70, acessível e com grande disposição para falar sobre os mais variados assuntos. Chico falou muito, de tudo: política, música, Brasil, censura, futebol, parcerias, viagens e até sobre a sua bebida predileta (era a Fernet Branca, a bebida amarga citada em “Cálice”). Enfim, material não faltava. Acredito que o maior desafio foi filtrar. Definir com critério o que deveria ser aproveitado. 

Chegaste a ter contato com o próprio ou o estafe dele?

Sondei, mas desde o início sabia que era quase impossível. Não notava em nenhuma movimentação por parte dele algum interesse em marcar os 80 anos – parece até que por esses dias ele está em Paris. Descobri também que ele odiava lembrar os acontecimentos ocorridos naquela época. Ressalto, porém, a ajuda que tive do escritor Eric Nepomuceno, amigo do Chico desde os anos 60, e da jornalista Martha Alencar, viúva do Hugo Carvana e também muito amiga do Chico. Eles me recordaram histórias, me deram caminhos, indicaram personagens e textos. E mais: se você notar, vai ver que há mais de uns 30 anos que Chico não dá uma entrevista completa, falando sobre diversos assuntos, principalmente os relativos ao seu passado. Quase todas as entrevistas dessas três últimas décadas são pontuais: o lançamento de um livro, de um disco, de um show…

Ficou algum ponto sem esclarecimento no tema da censura ao Chico?

De minha parte, nenhum. Tudo que me dispus a descobrir, descobri. Espero que o leitor saia com essa mesma sensação.

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