Memória

Capítulo 3: Da autoimagem ao aqui e agora

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Capítulo 3: Da autoimagem ao aqui e agora

Dez entre dez profissionais da psicologia asseguram que a formação da autoimagem e a consolidação do caráter dos seres humanos se dá até por volta dos 7 anos. Dali para frente, é saber o que cada indivíduo, na interação social, fará com aquilo que lhe aconteceu até então: é aprender a lidar, da melhor maneira, com o que se amalgamou internamente. 

Se essa premissa é correta, eu fico a me perguntar: qual seria a imagem que formei a meu respeito, lá no fundo, nos confins de mim mesmo, à época um garotinho que usava duas bengalas, óculos (ali pelos 8 eles entraram em cena, a miopia no DNA familiar dando as caras e enfeitando rostos), muitas vezes gesso (inclusive nas duas pernas, simultaneamente, ao menos uma vez), algumas oportunidades vestindo uns aparelhos estranhos nos membros inferiores, misto de ferros e tiras de couro que, adulto, beirando os 60, eu voltaria a usar, agora sob a alcunha de órteses?

As exterioridades, muitas vezes, são enganosas. As tais personas se fazem presentes, como uma defesa às inseguranças do convívio. Vai daí que, se de um lado fui um adolescente e jovem adulto alegre e intrépido, vindo do interior e faceiro por estar diante de um mundo novo que era a capital – de tal forma que as pessoas a minha volta tinham dificuldade de “enxergar” a minha deficiência –, lá dentro havia um gap a administrar, que poucos percebiam. Até porque nunca falei explicitamente sobre isso, nem mesmo com os psicólogos e psiquiatras com quem vim a ter contato mais adiante (as questões a resolver sempre foram de fundo prático, de conduta imatura da vida adulta, quase nada de interioridades problemáticas). 

O certo é que sempre fui um queridão, o simpático, o cara falante que “enche uma sala”, como minha mãe costumava dizer. Mas acontece que eu me chamo Ricardo Rodolfo (o único dos quatro irmãos com dois nomes) e sou de sagitário, metade homem disparando flechas para o infinito, metade quatro patas (duas pernas e duas bengalas?) atropelando o que estiver pela frente.

Como referi ali na abertura do parágrafo anterior, e que maravilhosamente Elis interpretava, na composição de Sérgio Natureza e Tunai, “As aparências enganam / Aos que gelam e aos que inflamam”. A outra face daquele cara intenso, divertido e sempre disposto a uma nova aventura sempre foi a impulsividade, o descontrole emocional, a ênfase desmedida nas palavras, as quais, desde sempre, aprendi a esgrimir, para o bem e para o mal, já que não teria chance se a coisa desandasse para o contato físico. Eu logo entendi: o que dói mais e leva mais tempo para curar: um soco no queixo ou um arranhão na alma? Até registrei esses pensares:

FIO DA NAVALHA

[Continua...]

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