Memória

Lugares da Classe Trabalhadora em Porto Alegre 12: A Praça dos Navegantes

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Lugares da Classe Trabalhadora em Porto Alegre 12: A Praça dos Navegantes

A região dos Navegantes começou a ser povoada de forma mais sistemática a partir da chegada dos imigrantes alemães, que se estabeleceram no Vale dos Sinos em 1824, pois aquelas paragens serviam de ponto de descanso para os comerciantes que vinham negociar os produtos das regiões coloniais. O processo de povoamento se tornou mais estruturado a partir da década de 1870, quando foi inaugurada a estrada de ferro de Porto Alegre a Novo Hamburgo (1874) e quando se iniciou a construção da Igreja e a abertura da praça de Nossa Senhora de Navegantes (1875), fruto da doação de um terreno de dona Margarida Teixeira de Paiva (que hoje empresta seu nome a uma rua próxima dali). A partir da inauguração da igreja, outros terrenos, que eram chácaras e pequenas fazendas, foram sendo loteados para a construção de moradias populares. O impulso mais consistente, no entanto, veio a partir da década de 1890, quando o Prado foi inaugurado ao lado da Praça dos Navegantes e as primeiras fábricas foram instaladas na região, fazendo com que o arrabalde se tornasse um bairro operário.

A praça localizada em frente à Igreja dos Navegantes se tornou um lugar de encontro e sociabilidade para os habitantes do bairro, inclusive é o lugar central da festa de Nossa Senhora dos Navegantes, que é a efeméride religiosa mais importante de Porto Alegre. Pela sua importância e pela localização estratégica, a Praça dos Navegantes se tornou palco de grandes manifestações operárias ao longo do século XX. Na “Greve dos 21 Dias” em 1906, que foi a primeira greve geral de Porto Alegre, foi realizado um grande comício em frente à Igreja, no dia 17 de outubro daquele ano, mostrando que a presença de operários e operárias mobilizadas já era significativo naquela região. Na Greve Geral de 1917, a Praça dos Navegantes recebeu um dos comícios que deflagrou o movimento paredista, no dia 31 de julho. Depois desse comício, uma coluna operária liderada por 70 mulheres tecelãs se deslocou através da rua Voluntários da Pátria, convencendo os trabalhadores das fábricas a pararem seu trabalho e se juntarem a elas em seu trajeto para o comício principal, que estava ocorrendo na praça da Alfândega.

A Greve de 1917 mostrou que a presença operária, principalmente das mulheres, era muito importante como força de mobilização social. Isso também era devido ao crescimento industrial da região, que se acelerou durante os anos 1910, trazendo uma nova dinâmica para aquela área da cidade. Em 1915, o Governo Municipal promoveu uma reorganização administrativa de toda a área ao norte da avenida Cristóvão Colombo, que se tornou o Quarto Distrito da capital. Em 1916, a fábrica de tecidos Renner foi instalada ao lado da Praça dos Navegantes, e em 1922 foi instalada a fábrica Rio Guahyba. Essas mudanças também influenciaram as mobilizações operárias, consolidando a praça dos Navegantes como um local de reivindicações coletivas. A greve de janeiro de 1929, pelo cumprimento da Lei de Férias, teve a participação dos operários da Renner e da Rio Guahyba, sendo que o movimento foi encerrado em uma reunião na praça dos Navegantes. Em outubro, a Confederação Regional do Trabalho e o Sindicato dos Operários em Fábricas de Tecido organizaram um grande protesto, no mesmo local, contra um lockout promovido pela fábrica Renner. Durante os anos de 1930, a praça também se tornou ponto de encontro para trabalhadores católicos, pois o Círculo Operário de Navegantes foi instalado no Colégio Paroquial em abril de 1934. 

A dinâmica territorial da região mudou bastante nas décadas seguintes, pois em 1958 foi inaugurada a ponte Getúlio Vargas, mais conhecida como ponte do Guaíba, que fez a ligação da capital com o sul do estado. A construção foi uma das maiores obras de engenharia do período, trazendo benefícios para a cidade, mas teve como consequência isolar a praça e a igreja dos Navegantes do seu entorno, fazendo com que ela deixasse de ser palco das grandes manifestações trabalhistas, como fora no passado. Mesmo assim, ela mantém sua importância para a comunidade e permanece como palco da maior festa da cidade, que é o dia de Nossa Senhora dos Navegantes.   


Frederico Bartz é mestre e doutor em história pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e trabalha como técnico em assuntos educacionais nessa mesma universidade, onde coordena o curso de extensão Caminhos Operários em Porto Alegre.

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