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Documentário coloca Lupicínio no seu devido lugar

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Documentário coloca Lupicínio no seu devido lugar Nelson Cavaquinho e Lupicínio Rodrigues. Foto: Instituto Moreira Salles/Divulgação

Documentário de estreia de Alfredo Manevy, Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor (2023) celebra o legado artístico de um dos maiores nomes da música popular brasileira. O filme que estreia nesta quinta-feira (14/3) recupera com preciosas imagens de arquivo e entrevistas a contribuição musical e o contexto histórico do cantor e compositor porto-alegrense, autor de clássicos como Nervos de Aço, Esses Moços, Vingança e Loucura.

Exibida no ano passado na 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, a produção da Plural Filmes em parceria com o Canal Curta! apresenta uma pesquisa ampla com materiais de arquivos do próprio Lupicínio Rodrigues (1914 – 1974), além de entrevistas e falas de artistas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Elza Soares e Gal Costa – que aparece tocando violão e com flor no cabelo, em imagens de 1973, interpretando a antológica Volta. Em Lisboa, o documentário recebeu o prêmio do público de melhor documentário no Festival Internacional da Língua Portuguesa.

Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor também aborda um episódio pouco conhecido da história do músico gaúcho envolvendo a canção Se Acaso Você Chegasse – primeiro grande sucesso do compositor, gravada inicialmente por Ciro Monteiro e popularizada depois com a voz poderosa de Elza Soares. A música fez parte da trilha sonora de um musical de Hollywood chamado Dançarina Loura (1944), sendo indicada ao Oscar de 1945. Mas, além de não ter sido consultado sobre o uso da canção no filme, Lupicínio só foi receber direitos autorais anos depois. Até hoje seus créditos na indicação ao Oscar não foram reconhecidos.

Os versos de Lupicínio atravessaram fronteiras também na voz da cantora Linda Batista, que gravou Vingança – e, por conta desse sucesso, realizou turnê internacional. Aí, sim, vieram os direitos autorais: com parte do dinheiro, Lupicínio comprou um carro – que, segundo ele, era o mais bonito de Porto Alegre.

Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo/Divulgação

“Eu quis que essa questão dos direitos e créditos ganhasse força no filme porque Lupicínio vendia sambas no câmbio negro. A questão não é só de crédito, mas de economia da cultura. Se a música é o que o Brasil faz de melhor, por que não somos capazes, enquanto país, de dar o devido retorno econômico aos mestres da nossa música? A riqueza resultante desse valioso patrimônio cultural deveria chegar aos autores”, comenta o diretor Alfredo Manevy, ex-secretário executivo no Ministério da Cultura e professor de cinema na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Além de evocar histórias saborosas contadas pelo próprio Lupicínio, o longa procura dimensionar a importância do artista na música brasileira, ressaltando as dificuldades para um homem negro do extremo sul do país chegar ao centro da indústria cultural do seu tempo. Do samba ao tango, passando por outros gêneros e até pela autoria do Hino do Grêmio, Lupi tornou-se uma referência cultural ainda hoje destacada e querida no imaginário nacional.

“Lupicínio é o pai da música de sofrência, que se tornou com ele e depois dele um gênero imensamente popular. Não por acaso Lupi atravessa gerações de intérpretes. Não ocultamos as atitudes, letras e emoções dele com as mulheres de sua vida porque isso seria apagar algo da essência de sua musicalidade e da verdade de sua história. Esconder o machismo não nos ajudaria a compreender e refletir as contradições da época. Ali estão misturados a paixão, o romance, a traição e, claro, o machismo daquele período”, justifica Manevy.

O diretor comenta ainda que “o desejo da família de conhecer o passado do ‘Tio Lupi’, sua genealogia e ancestralidade foi um das motivações do roteiro”: “A família Rodrigues, assim como muitas outras famílias negras brasileiras, viu seu passado ocultado. E o filme busca trazer à tona a potência musical e emocional de Lupi e, com ele, a história resistente da negritude do Sul do Brasil”.

Cartaz do filme. Créditos: Acervo Família Rodrigues/Divulgação

Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor: * * * *

COTAÇÕES

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Assista ao trailer de Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor:

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