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“Há um poder nos escritores e na literatura que enciuma os políticos”

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“Há um poder nos escritores e na literatura que enciuma os políticos”
por Humberto Pereira da Silva Crítico e historiador da literatura e professor do Collège de France, William Marx é o autor de Ódio à Literatura: Uma História da Antiliteratura, que acaba de ser lançado no Brasil pela Paco Editorial. O estudo aborda os ataques sofridos pela literatura ao longo do tempo: segundo o autor, os confrontos que resultam da contrariedade em relação a ela têm características comuns, desde a Antiguidade. Vindos da filosofia, da religião ou das ciências, os ataques à literatura incidem sobre os seguintes pontos: a autoridade de que seria dotada uma obra literária, a verdade que expressa, o sentido de moralidade que carrega e sua utilidade prática na vida social. Assim, constantemente filosofia, religião e ciências se voltariam contra a literatura por meio de discursos que possuem em comum argumentos que visam minar sua autoridade, seu propósito de enunciar a verdade, sua carga de valores morais e sua aceitação social. Por meio da interpolação de textos, de digressões pinceladas e de situações ao logo da história, o livro cruza momentos e mostra como filósofos, religiosos e cientistas instigaram a literatura. A tradução para o português de Ódio à Literatura é de Humberto Pereira da Silva, professor de filosofia, ética e história do cinema na FAAP-SP (Fundação Armando Alvares Penteado) e crítico de cinema. Na entrevista a seguir, feita por Humberto, William Marx comenta alguns célebres casos de ataque à cultura literária ao longo da história e alerta para a atualidade dos discursos antiliterários. No primeiro litígio, sobre a autoridade, você insiste sobre a importância de Platão na condenação da poesia. Você põe em evidência a luta pelo poder entre a filosofia e a literatura. Ao mesmo tempo, você sustenta que Platão, por meio de alegorias como a do mito de Er, não escapa da crítica que ele próprio faz à atividade poética. Mas, o leitor que conhece Platão pode sustentar que a função da alegoria é a de exemplificar. Para esse leitor, você parece confundir a utilização de uma imagem com a questão central do pensamento platônico. Para Platão, a finalidade da filosofia é tão somente buscar a verdade. Pode-se sustentar que Platão criou historicamente o problema da verdade. Mas ele não deu resposta satisfatória ao problema que criou e igualmente não foi suficientemente claro no procedimento que lançou mão para dar resposta ao problema da verdade. Negar aos poetas o poder de dizer a verdade é da parte de Platão uma ação fundadora: ele cria, assim fazendo, a literatura no sentido moderno do termo, a saber, um discurso que tinha por fim apenas a distração e, assim, não se servia como ensino, ou seja, como formação do espírito. Ao proceder dessa forma, Platão instaura uma ruptura radical entre o discurso da poesia e o da filosofia. Ora, ele assim realiza tão somente o que ele próprio anuncia. E não é coerente no efeito que provoca ao banir os poetas para fora da cidade à medida que ele recupera para seu uso pessoal os instrumentos da poesia, […]

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