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Era uma vez na Anatólia

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Era uma vez na Anatólia Foto: Supo Mungam Films/Divulgação

Terceiro filme do premiado diretor turco Emin Alper, O Conto das Três Irmãs (2019) participou no ano passado da Mostra Competitiva do 69º Festival Internacional de Cinema de Berlim. O longa estreia no Brasil nesta quinta-feira (15/10) diretamente no streaming, nas plataformas Now e Vivo Play. Exibido nos festivais de Sevilha e Jerusalém, O Conto das Três Irmãs passou ainda por diversos outros eventos internacionais – como o Festival de Istambul, onde levou os prêmios de melhor filme, direção, trilha sonora e atriz (concedido às três intérpretes que vivem as irmãs do título).

O drama mostra o reencontro familiar de Reyhan (Cemre Ebuzziya), Nurhan (Ece Yüksel) e Havva (Helin Kandemir) em uma remota aldeia nas montanhas do interior da Turquia. As três partilham um destino comum, considerado uma valiosa oportunidade de ascensão social nessa comunidade humilde: serem enviadas para famílias ricas da cidade como besleme (misto de filha adotiva e empregada doméstica), na esperança de melhorar suas vidas. Porém, por diferentes motivos, todas são obrigadas a voltar para a casa do pai. Se cada jovem possui uma personalidade muito singular – sempre fortes e afirmativas –, o que as coloca seguidamente em conflito entre si, a condição comum de mulher, socialmente inferiorizada nessa sociedade, acaba por aproximá-las em suas confrontações particulares do patriarcalismo.

O Conto das Três Irmãs confirma o talento narrativo do realizador Emin Alper, já demonstrado em Beyond the Hill (2012), filme ganhador de láureas como o Caligari Film Prize no Festival de Berlim, e Frenzy (2015), Prêmio Especial do Júri no Festival de Veneza. A grandiosa paisagem das montanhas da Anatólia, região onde o diretor e roteirista foi criado, é magnificamente registrada em lindas imagens que emolduram a história, conferindo-lhe um tom de parábola ancestral ao colocar lado a lado o rústico e o maravilhoso, o primitivo e o poético – e que remete visualmente a títulos de outros cineastas turcos como Nuri Bilge Ceilan, dos deslumbrantes Era uma Vez na Anatólia (2011) e A Árvore dos Frutos Selvagens (2018), e Semih Kaplanoglu, da trilogia Ovo (2007), Leite (2008) e Mel (2010).

Mas a primorosa fotografia, a trilha sonora marcante, os diálogos precisos e as ótimas atuações – especialmente do trio feminino central – não servem apenas para contar uma comovente e poderosa história de sororidade: o filme também ressalta o abismo social existente entre a Turquia urbana e o interior profundo do país. O vilarejo de Sevket (Müfit Kayacan) e suas filhas é um lugar semiabandonado, assombrado por visões de velhos trabalhadores da mina local fechada e de misteriosos assassinos de pastores. Suspensos no tempo estático e esquecidos na imensidão do espaço belo e rude, aos habitantes não resta alternativa que sonhar com um lugar melhor – idealizando a cidade com um irrealismo equivalente ao do médico que romantiza a vida simples do campo quando visita a família de Sevket.

Com seu título tchekhoviano, O Conto das Três Irmãs lança um olhar a um só tempo duro, compassivo e esperançoso para homens e mulheres atados a um ciclo existencial imutável – um destino do qual talvez só Hatice, a “idiota da aldeia”, parece desvencilhar-se com suas inusitadas cambalhotas libertárias colina abaixo.

O Conto das Três Irmãs: * * * *

COTAÇÕES

* * * * * ótimo     * * * * muito bom     * * * bom     * * regular     * ruim

Assista ao trailer de O Conto das Três Irmãs:

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