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“Pele” ecoa as narrativas gritadas nos muros da cidade

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“Pele” ecoa as narrativas gritadas nos muros da cidade Embaúba Filmes/Divulgação

As paisagens urbanas de grandes metrópoles brasileiras respondem não apenas pelo cenário, mas também pelo protagonismo de Pele (2021), documentário de Marcos Pimentel que estreia nesta quinta-feira (26/10). Grafites, pichações, símbolos indecifráveis, palavras de ordem, manifestações políticas, declarações de amor e fragmentos poéticos conduzem esse ensaio visual rodado em Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro e que prescinde de narração ou diálogos.

Realizador de documentários igualmente inventivos como Sopro (2013) e Fé Fúria (2019), Marcos Pimentel conta que Pele surgiu do interesse pela experiência de viver em cidades inchadas – cheias de pessoas, conflitos e contradições – no Brasil e na América Latina e pela pulsão da arte urbana encontrada nelas. “Eu sempre gostei de caminhar pelas cidades prestando atenção no que está presente nos muros, paredes e estruturas de concreto. Incontáveis grafites, pichações, publicidades, letras, mensagens políticas, palavrões… É possível encontrar de tudo ali, numa caótica composição visual que diz muito do nosso tempo e dos lugares que habitamos”, afirma o realizador.

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Embaúba Filmes/Divulgação

Morando em Belo Horizonte, Pimentel diz que começou a perceber ali mesmo as interações espontâneas que as pessoas têm com a arte urbana: “Mesmo sem nos darmos conta, a todo momento nossos corpos estão dialogando com os conteúdos que ‘vestem’ os muros. Ali, nessa espécie de pele, os ‘habitantes dos muros’ interagem com os ‘habitantes das cidades’, produzindo leituras bastante interessantes que, infelizmente, nem sempre temos tempo de contemplar”.

O longa foi rodado em 2019, e filmar nas ruas foi um desafio para a equipe. “A rua é um ambiente que me encanta justamente pela falta de controle quando se filma um documentário. Nunca é fácil, mas também poucos espaços são tão ricos e prazerosos para um documentarista como as ruas das cidades. Não tínhamos controle de nada e nunca nos propusemos a isso. Então, era um filme onde precisávamos esperar muito e filmar pouco. Eram horas esperando até que determinada situação acontecesse espontaneamente diante de algum grafite ou pichação”, explica o diretor.

Como foi filmado sem captação de som direto, Pele teve seu áudio todo construído na pós-produção por Vitor Coroa – que, além de reproduzir os sons do que se vê na tela, acrescentou também várias camadas e possibilidades de interpretação a partir de ruídos, recortes de falas e trechos com música incidental. “As narrativas urgentes das ruas estão sempre ali, estampadas nos muros, que são encarados como espaços onde os artistas e os moradores das cidades podem gritar para o mundo tudo o que pensam e também extravasar as muitas opressões a que são submetidos no cotidiano. Fica tudo depositado ali, até as pessoas e o tempo agirem sobre esses conteúdos, modificando-os uma vez mais”, acrescenta Pimentel.

Embaúba Filmes/Divulgação

Pele é um filme que dialoga com as outras obras de Pimentel – especialmente com os curtas Pólis (2009), Urbe (2009) e Taba (2010) –, ao mesmo tempo que repete a observação mais contemplativa de títulos como A Arquitetura do Corpo (2008), Sopro e A Parte do Mundo que Me Pertence (2017).

“Acho que em Pele dei um passo a mais em relação a esses trabalhos anteriores, caminhando na direção de algo que venho perseguindo nos últimos tempos, que é conseguir equilibrar e alternar poesia e política ao longo da construção da obra. Ando bastante instigado por filmes que possuem camadas poéticas na construção de sua linguagem, mas que não se dissociam da construção política do discurso. É uma obra na qual política e poesia caminham de mãos dadas o tempo todo, fazendo com que o filme seja uma experiência sensorial pelas ruas das cidades e pelas artes e intervenções encontradas ao longo do caminho, sem nunca perder de vista um discurso político bem marcado, que está entrelaçado na construção de praticamente todas as sequências do filme”, resume o cineasta.

Embaúba Filmes/Divulgação

Embaúba Filmes/Divulgação

Pele: * * * *

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Assista ao trailer de Pele:

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