Democracia e responsabilidade
Há alguns anos o sociólogo espanhol Manuel Castells escreveu um artigo sobre a Comunidade Europeia argumentando que, se os europeus querem efetivamente construir uma unidade política, não podem se inspirar no passado, pois seu passado é um exemplo de tudo, menos de fraternidade. É um passado de guerras, ódios, ressentimentos e massacres dentre os piores já praticados em toda a história humana. Não há, nele, nada que justifique uma unidade política.
Se os europeus querem construir a unidade, argumentava Castells, devem olhar para o futuro: devem construir a ideia de um futuro comum pelo qual valha a pena superar os traumas do passado.
O argumento é simples: afinal, só se constroem acordos políticos em nome do futuro. Mas ao mesmo tempo é complexo, pois construir uma ideia de futuro desejável a todos implica a capacidade de abstrair-se dos interesses atuais de cada um dos participantes. Implica deixar de lado as conveniências e personalismos e abrir espaço para a razão.
Este raciocínio é plenamente válido para os partidos de esquerda e centro-esquerda no RS. Seu passado comum é de desconfianças, acusações de traições e manipulações. PT e PSB fazem o papel de Alemanha e França nas esquerdas gaúchas: foram alternativamente aliados e inimigos, acumulando ressentimentos mútuos que criam enormes dificuldades para sua aproximação, sem a qual o RS estará entregue a um obscurantismo do qual provavelmente não encontremos referência na história do estado.
Mas o que impede sua aproximação não é o passado inglório – é a incapacidade, até agora demonstrada por ambos, de construir uma ideia de futuro que esteja acima dos valores do passado, abrindo uma nova dinâmica à política rio-grandenses, desbloqueando as energias cívicas da cidadania e deixando os porta-vozes do atraso falando sozinhos.
Construir essa ideia não é fácil! A própria situação dos partidos políticos brasileiros, de esquerda inclusive, cada vez mais motivados por interesses corporativos internos em detrimento da representação responsável da sociedade, dificulta isto. Mas a dificuldade não é justificativa! Pelo contrário, é o terreno onde se mostram as grandes lideranças, as visões dos homens e mulheres que se elevam acima das circunstâncias e revelam-se autênticos Políticos. E aqui não há meio-termo: ou cumpre-se o papel que a História exige, ou vai-se para a lata de lixo da História! Um desses dois destinos aguarda os partidos de esquerda e centro-esquerda do RS.
Renato de Oliveira é sociólogo – Membro da Executiva Estadual do PSB/RS.
Hermes Zaneti é professor, ex-deputado federal Constituinte.