Juremir Machado da Silva

Coração das chuvas

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Coração das chuvas Foto: Maurício Tonetto / Governo do RS

Um ciclone extratropical atravessou o Rio Grande do Sul na madrugada da última sexta-feira. Houve mortes, desaparecimentos, acidentes, árvores tombadas, ruas e estradas interrompidas, residências sem energia elétrica, gente perdendo tudo, sendo que, muitas vezes, tudo era o pouco que possuíam. Quando as forças da natureza se desencadeiam furiosamente, segundo suas leis, é hora de ver como a humanidade reage e tenta se proteger. Os seres humanos há muito desafiam o meio ambiente. Faz parte da ideologia moderna cartesiana pensar que o Homem é senhor da natureza, podendo submetê-la aos seus desígnios. Sombria ilusão do antropoceno, o delírio humano de poder.

Autoridades trataram de agir. O presidente Lula telefonou ao governador Eduardo Leite para colocar recursos à disposição do Rio Grande do Sul e designou os ministros Waldez Góes (Desenvolvimento Regional), Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social) e Paulo Pimenta (Comunicação Social) para acompanhar a situação no local. Leite, por seu turno, divulgou um vídeo da conversa com Lula e tomou suas providências. O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, conhecido por ir à linha de frente nessas horas, foi a campo como de costume. No Twitter, Melo escreveu: A atuação da @CEEE_Equatorial é fundamental para restabelecermos o abastecimento de água. Muitas comunidades estão em situação dramática. Precisamos de esforço total e trabalho conjunto para retomar a energia”. Seria um reconhecimento do papel da empresa? Uma exortação? Uma cobrança? Um estímulo do tipo “vamos, vamos, vamos, que o momento exige determinação”?

A CEEE Equatorial ainda não convenceu a população da qualidade dos seus serviços prestados. Mesmo quem não se liga nas divisões do bolo urbano por capitanias energéticas, observa discrepâncias e anota o desânimo de muitos. O “outro lado da Osvaldo Aranha”, como dizemos nós, os moradores do “lado do cá, daquele lado que fica entre a Vasco da Gama e a Osvaldo, vive tendo cortes de energia. Porto Alegre caminha a passos lentos para o futuro com seus fios elétricos expostos, com suas canalizações sempre à beira de um colapso, o que se vê pelo alagamento de ruas com qualquer chuva. Um ciclone evidentemente assusta e provoca danos extraordinários. É um trauma social.

Nessas horas, confesso, impotente, eu penso nessa gente que sofre. O sofrimento deles parece ser o resultado da incontinência da natureza, que ruge, ronca e destrói o que encontra pela frente, mas essa dor de quem perde o que nem tem encontra suas raízes mais profundas na mão humana, no que ela toca ou naquilo que ela deveria tocar e não faz. Quanta incúria dos poderes, quando desleixo, quanta negligência, quanto falta de cuidado pelo simples fato de que interesses econômicos se sobrepõem a interesses humanitários.

Durante muito tempo se usou o termo fatalidade para encobrir danos causados pela natureza em função da imprevidência humana. Diante do que se viu na última sexta, no Rio Grande do Sul, impossível não lembrar pela enésima vez a célebre exclamação do “Coração das trevas”, de Joseph Conrad:

– O horror! O horror!

O horror provado pela fúria da natureza acentuado pelo humano.


Tambor tribal (CPERS paralisa)

Fala, Sindicato dos Professores do RS: “Nesta terça-feira (20), o CPERS e a Frente dos Servidores Públicos (FSP) realizam a Paralisação Estadual em defesa do IPE Saúde e por salário digno. O projeto de reforma do Instituto (PLC 259), proposto pelo governador Eduardo Leite (PSDB), pode ser votado neste dia. A mobilização inicia às 9h, com concentração em frente à sede do CPERS (Av. Alberto Bins, 480 – Centro) e caminhada até o Palácio Piratini. Às 14h será realizada a Assembleia Geral Unificada, na Praça da Matriz. O PLC 259 ameaça o bolso e a saúde de milhares de famílias.

Vale destacar que um milhão de gaúchos, o equivalente a 10% da população, estão à beira do desamparo, privados do acesso à assistência médica e hospitalar fornecida pelo IPE Saúde. Os novos custos tornarão essa situação insustentável. A crescente dificuldade de lidar com as contribuições elevadas ao IPE Saúde poderá levar um número expressivo de servidores a migrarem para o já sobrecarregado SUS, podendo levá-lo ao colapso.”


Sbornia nos 45 anos da Adufrgs

Foto: Arquivo pessoal

A Associação dos Docentes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Adufrgs), hoje Adufrgs-Sindical, festejou seus 45 anos de existência, começados ainda na ditadura militar, com o show “Sbornia Kronta Atracka”, no auditório Dante Barone, da Assembleia Legislativa do RS. No palco, para duas horas de alegria, divertimento e muita música hipnotizante, Hique Gomez (voz e muitos instrumentos), Simone Hasslan (piano e voz), Tales Melati (gaita de fole e saxafone) e Gabriella Castro, grande sapateadora. Muito talento local. A Adufrgs tem uma vasta folha de serviços prestados à educação no RS.


Parêntese da semana

“Parêntese #179: Dez anos”. As jornadas de junho de 2013 não poderiam escapar ao crivo da revista cultural mais incisiva do Rio Grande do Sul. Luís Augusto Fischer situa: “Os ritmos da história são meio insondáveis. Num junho, dez anos atrás, o país foi pisoteado por incontáveis passeatas, cada uma contendo dezenas de grupos, cada qual por sua vez tendo em mente teses, palavras-de-ordem e desejos nem sempre convergentes com os de outros dos grupos que marchavam ali, ao lado”. Textos, sobre esse e outros assuntos, de José Falero, Graça Craidy, Ângelo Chemello Pereira, Arthur de Faria, Arnoldo Doberstein, Fernando Seffner, Zilá Bernd, Júlia Rosa Simões, Paulo Damin e Karina Lucena.


Frase do Noites

O iluminista em tempos tecnológicos: “Nunca deixe o seu celular falar com estranhos. Telefones contam tudo, especialmente sobre golpes”.


Imagens e imaginários

No Pensando Bem, parceria do Matinal, da Parêntese e da Cuboplay, que vai ao ar na FM Cultura, 107,7, todos os sábados às 9h, Nando Gross, Luís Augusto Fischer e eu conversamos com a antropóloga Ondina Fachel Leal sobre seu livro “Os gaúchos: cultura e identidade masculinas no pampa” (Tomo). Uma viagem ao coração da cultura mais profunda do Rio Grande do Sul.


Escuta essa

Para quem quiser fazer uma viagem hiperbólica, sem sair de casa, às origens da Sbornia e aos confins das possibilidades intergaláticas:

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