Juremir Machado da Silva

Cotas mudaram as universidades

Change Size Text
Cotas mudaram as universidades Foto: Gustavo Diehl/ UFRGS

Chegamos aos 10 anos da Lei das Cotas, a Lei nº 12.711/2012, que mudou a cara e a cor das universidades brasileiras e está tornando o País muito mais inclusivo, embora falte muito para deixar de ser racista. Sem esse pé na porta o sistema educacional teria permanecido o instrumento de hierarquia social que era, sem qualquer brecha ou mudança substancial. Ainda há quem seja contra as cotas raciais.

Três grupos aparecem quando se trata de rejeitar as cotas: os racistas, que obviamente não se apresentam como tal; os defensores de cotas exclusivamente sociais por razões ideológicas (marxistas ortodoxos que só enxergam classes sociais); os velhos iluministas, que não aceitam qualquer política tendo como critério raça, sexo, gênero, etc, apostando num universalismo que já mostrou ser o melhor tapume para a discriminação. Há também aqueles que se agarram a uma falsa meritocracia, aquela em que pessoas com oportunidades de preparação totalmente diferentes respondem a uma mesma prova e disputam uma mesma vaga como se estivem em condições equivalentes de competição. 

Escrevi muito nesses 10 anos sobre a questão das cotas. Sem cotas “raciais” os negros levariam mais 500 anos para ultrapassar os 2% que frequentavam os bancos das instituições mais desejadas em determinado momento. Essa história de que a universidade deve ser para os melhores é puro elitismo. Essa meritocracia nunca passou de reprodução da desigualdade. Vestibular não mede só inteligência. Mede, antes de tudo, condições desiguais de preparação. A universidade deve servir para preparar os jovens, não para hierarquizá-los em melhores e piores, bons e ruins, competentes e incompetentes. Boas universidades são aquelas que pegam alunos com preparação insuficiente e os transformam em bons profissionais. A resistência às cotas continua sendo uma defesa de interesses particulares dissimulada de valor universal. Basta ver que o principal adversário das cotas em certo momento muito polêmico foi o DEM, que já fora PFL, PDS e ARENA, pilar da ditadura, hoje atendendo pelo nome fantasia de União Brasil

Raças não existem. As cotas “raciais” não são raciais. O conceito de “raça” responde a uma visão sociológica. O preconceito tem a ver com a cor da pele das pessoas e com outros elementos fenotípicos. A noção de raça foi desenvolvida no século XIX como um elemento “científico” para justificar a dominação branca. Em outras palavras, foi mais um artifício do colonialismo para se autojustificar e tentar convencer os dominados a aceitar a condição a que estavam submetidos. O racismo quis dar-se uma legitimação “inquestionável”.

 No plano da educação, a questão não se resume a identificar os melhores. É preciso perguntar: por que eles são os melhores? Mais do que isso, eles “são” os melhores ou “estão” melhores? Os outros termos, os “piores” podem vir a ser os “melhores”? Os defensores da meritocracia não se importam com os “piores”. Eles que se ralem. O mundo, porém, é de todos. As cotas revolucionaram as universidades brasileiras, tornando-as mais plurais. Os cotistas rapidamente se integram nas universidades e têm rendimento igual aos demais. Na verdade, nunca sei quem é cotista. Todos são apenas estudantes.

RELACIONADAS

Esqueceu sua senha?

ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.
ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.