Juremir Machado da Silva

Independência paga em libras

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Independência paga em libras A Coroação de Dom Pedro I, Jean Baptiste Debret. Foto: Raylson Ribeiro/MRE

(Carta de D. Pedro I ao pai)

“Meu augusto pai. Por Sir Charles Stuart, plenipotenciário de Sua Majestade Britânica e de Vossa Majestade, recebi a carta de Vossa Majestade, datada de 13 de maio do corrente ano, na qual Vossa Majestade o acreditou perante mim como seu plenipotenciário e dizia que desejava o tratasse com aquele acolhimento e apreço que devia. Foi mui grande o meu prazer, recebendo a carta de Vossa Majestade, e duplicado, quando vi que Stuart era autorizado a tratar de reconhecer a independência do Império do Brasil.

“Nomeei imediatamente plenipotenciários, pela minha parte, Luís José de Carvalho e Melo, o Barão de Santo Amaro e Francisco Vilela Barbosa. Fizeram-se as trocas de poderes do estilo entre os negociadores e começaram-se a entabular as negociações, que tiveram fim a 29 de agosto pretérito, por haverem concluído o tratado, assinado nesse mesmo dia e ratificado por mim no imediato, assim como a convenção sobre indenizações, na qual foi acordado dar o Brasil, na forma nela expressada, dois milhões de libras esterlinas, de cuja soma Vossa Majestade poderá tirar já para si, por indenização das suas propriedades, a quantia de 250.000 libras, pois Gameiro já tem ordem para as pôr à disposição de Vossa Majestade, e, quando Vossa Majestade julgue pouco a soma, pode reclamar, na forma da citada convenção, o que espero não tenha lugar, atenta a generosidade de Vossa Majestade.

“Vossa Majestade verá que fiz da minha parte tudo quanto podia e, por mim, no dito tratado, está feita a paz. É impossível que Vossa Majestade, havendo alcançado suas reais pretensões, negue ratificar um tratado que lhe felicita seus reinos, abrindo-lhe os portos ao comércio estagnado, e que vai pôr em paz tanto a nação portuguesa, de que Vossa Majestade é tão digno rei, como a brasileira, de que tenho a ventura de ser imperador.

“Neste passo, Vossa Majestade vai mostrar ao mundo que ama a paz e igualmente a um filho que anuiu às suas reais pretensões, concedendo no tratado pontos bem difíceis e bastantemente melindrosos, como Vossa Majestade não ignora. Eu, meu pai, conto tanto que Vossa Majestade ratificará o tratado e convenção, pois conheço seu coração dócil, benigno e amigo da paz, que no dia 7 de setembro publico o tratado e me reputo já reconhecido por Vossa Majestade e estabelecida a mais perfeita harmonia entre as nações portuguesa e brasileira.

“Consulte Vossa Majestade seu real coração: ele lhe ordenará que ajude a realeza na América por seu próprio interesse, independente daquelas relações que devem haver entre um pai e um filho, ambos soberanos. Não perca Vossa Majestade a ocasião de se fazer ainda mais célebre aos olhos do mundo e a glória de ser chamado, não só pelos portugueses, mas até pelos brasileiros, o generoso João VI.

“Agora só me resta fazer votos ao Céu, para que dilate os anos de Vossa Majestade e lhe faça conhecer quanto é querido e amado por este seu filho, que, como tal, lhe beija sua real mão. – Pedro – Rio de Janeiro, 3 de setembro de 1825.”

Conclusão do historiador Francisco Adolfo de Varnhagen: “Ao Brasil, felizmente, nenhum transtorno resultou da má redação do tratado, com o qual, aliás, ganhou muito em estabilidade e em consideração ante as nações estranhas; ao passo que a Portugal não só de pouco proveito foram os milhões de libras esterlinas que recebeu e o título de imperador, dado nos últimos dias ao seu velho rei, com rebaixa até da sua dignidade, como (o que foi pior) as dúvidas deixadas acerca dos direitos de sucessão vieram a contribuir, como já dissemos, às calamidades sem conta por que passou e que só terminaram pelo próprio esforço do Imperador do Brasil, à custa de não pequenos perigos e até da própria saúde e vida, depois de ter abdicado à coroa do Brasil”.

Conclusão deste modesto escriba: com família não se brinca. Indeniza-se.

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