Juremir Machado da Silva

Jovem Pan e seu estrago

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Jovem Pan e seu estrago Então presidente Jair Bolsonaro em entrevista à Jovem Pan News, em 2021, em São Paulo (Foto: Isac Nóbrega/PR)

Se teve um veículo de comunicação que fez mal ao Brasil nos últimos tempos foi a rádio Jovem Pan, de São Paulo. Não faz muito, esse nome era pouco conhecido dos brasileiros em geral. Durante o governo reacionário de Jair Bolsonaro, a Jovem Pan tornou-se uma potência nacional. O dono e chefão, conhecido como Tutinha, aderiu ao governo como um carrapato à sua fonte de sangue. Encheu a programação da emissora de comentaristas de extrema direita e tocou o barco. Nomes desconhecidos viraram rapidamente celebridades fazendo o que podiam fazer: disparando contra a democracia e contra o fantasma do comunismo. Nunca se ouviu tanta asneira dita com tanta convicção.

Mal terminou o reinado do capitão de tantas malícias, Tutinha começou a ejetar a extrema direita aninhada na sua rádio. Depois da ação fascista em Brasília, Tutinha cortou a própria cabeça. A Jovem Pan, que ganhou o apelido de Jovem Klan, parece um tanque estragado tentando guinar ao centro ou a qualquer posição que a livre de incômodos judiciais e do constrangimento de continuar bolsonarista. Nesta semana, o passaralho, que é como jornalistas chamam demissões em pacotes, pegou a cubana Zoe Martinez e Paulo Figueiredo, neto de João Figueiredo, o último ditador no rodízio dos generais de plantão na ditadura midiático-civil-militar implantada no Brasil em 1964, aquele que preferia cheiro de cavalo a seres humanos. Pegou também Rodrigo Constantino, cujo ultraconservadorismo dispensa apresentações.

Outros já tinham ido ao ar, quero dizer, saído do ar. Qual era o estilo da Jovem Pan: atirar primeiro, perguntar o nome depois; noticiar primeiro, checar depois ou nunca; aterrorizar com violência verbal, simbólica e cara de pau. Até aí pode parecer o que sempre existiu. Sim e não. O velho assumiu cara nova deixando de lado qualquer pudor. Entrar rápido, sair mais rápido ainda, eis a filosofia oportunista do líder. Tutinha errou a especulação: acreditava que Bolsonaro e o bolsonarismo governariam por muito tempo. Instalou-se feito um vândalo nos palácios de Brasília para colher os louros.

Quebrou a cara. Não seja por isso, aos perdedores as cascas das batatas e a demissão. Dizem que Bolsonaro foi eleito graças às redes sociais e ao Zap. As rádios contaram talvez até mais do que isso. O Brasil tem em torno de dez mil rádios, sendo que quase duas mil ainda transmitem em AM. Quatro mil rodam em FM. Se duvidar, a maioria acachapante é bolsonarista. Já pensaram nisso? Em cada cidade uma rádio, ou mais de uma, despejando bolsonarismo nos ouvidos de um público fiel acima de quarenta ou cinquenta anos, tendo as redes sociais e o WhatsApp como fontes de desinformação e intrigas? Daí a minha tese: o rádio elegeu Bolsonaro e disseminou o bolsonarismo.

A Jovem Pan serviu de matriz. Ela e suas cópias se multiplicaram como um vírus. Nenhuma vacina foi inventada a tempo de evitar que a Jovem Pan e suas mutações devastassem mentes em todo território nacional. Porto Alegre não escapou à contaminação. Era entrar num táxi ou num carro de aplicativo para se constatar a situação vivida pelo Brasil. A Jovem Pan ficará em nossa memória como a pior rádio do país.

O trocadilho é infame, até por ser trocadilho, mas é real: Rádio Jovem Pânico. Uma máquina de produzir opiniões sem fundamento.

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