Juremir Machado da Silva

Saudades da Lili

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Saudades da Lili

Conhecemos a Lili quando tomávamos o caminho do Bueiro de Arcos e da Toca do Tigres, em Palomas. Lili tem história. Ela estava com nossa prima Fátima e com um cusco simpático. Fátima não quis ir conosco. Era longe. O cusco também não. Lili saiu na frente, caminhando sobre um trilho. Depois, começou a nos seguir como se fosse um cachorro. Lili é uma gatinha laranja. Essa gatinha aí da foto. Ela apronta uma atrás da outra, segundo revelou nosso primo Eleú, que agora mora em Palomas. A gatinha subiu numa árvore muita alta e não soube descer. Caiu como uma fruta. Todo dia ela faz alguma coisa diferente. Não suporta monotonia.

O Bueiro de Arcos e a Toca do Tigre fazem parte da mitologia palomense da nossa infância. Palomas teve sua história marcada pela linha férrea. O Bueiro de Arcos está encoberto por mato. Já não se pode ver sua beleza. A Toca do Tigre pode ser vista de longe. Ganhou novo status ultimamente: paleotoca. Casa de preguiça gigante. Fica no campo pertencente à vinícola Almadén. Alguém me disse que a Miolo e Galvão Bueno são os donos desse lugar. Fiquei desconcertado. Galvão Bueno! Era tudo do Seu Candoca. Nunca fui, quando criança, à Toca do Tigre. Era perigoso. Tudo era muito perigoso. Devia ser mesmo. Isso só aumentava o nosso interesse. Incontáveis eram os “causos” de galpão envolvendo essa caverna no pampa. A nossa expedição saiu tarde de casa. Não previmos a chegada rápida da noite. Tivemos de bater em retirada.

Lili cansou no caminho. Deitou-se de lado para descansar. Aceitou o colo de cada um – Jorge, Neide, Leo, Cláudia e eu –, mas sempre por pouco tempo. Fiquei sabendo que gatos dessa raça são assim: comunicativos, sociáveis, nada a ver com o estereótipo do bichano ausente e soberbo. Como não chegamos à Toca de Tigre, resolvemos fazer essa foto na “toca da gata”. Sábia, Lili não entrou no buraco. Fiquei pensando se teríamos a mesma prudência na Toca do Tigre. Lili nos deu uma lição. Devolvemos Lili sã e salva ao Eleú. Já era noite. Caminhar naqueles campos e trilhos no escuro não seria divertido. Na próxima vez a organização do evento tomará mais cuidados. A partida será de manhã.

No dia seguinte, fomos nos despedir do Eleú, o cara que me trouxe para Porto Alegre, em 1980. A lagoa da frente da sua casa, um marco dos anos de infância naqueles pagos, estava seca. Nunca a tinha visto assim. Sei que já choveu e a lagoa está novamente cheia. Falamos sobre as façanhas de Lili, que ameaçava saltos felinos toda vez que uma galinha passava com seus pintos. E fomos embora. De repente, olhamos para trás e quem vimos? Lili que nos seguia junto aos trilhos. Tivemos de interromper os seus planos de evasão. Lili não parece se deixar apropriar. Segue quem passa por ela. Talvez sinta cheiro de aventura.

Lili me fez pensar na “Fome Zero”, uma gatinha que conhecemos em 2003. Como não quisemos trazê-la para Porto Alegre, foi doada pela dona da pousada. Eu diria mesmo despachada brutalmente. Temos recebido notícia da Lili. Ela ainda não fugiu de casa. Nem caiu de outra árvore.

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