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Prefeitura encaixota livros da biblioteca da Smed, mas não revela destino nem data para transferência do acervo

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Prefeitura encaixota livros da biblioteca da Smed, mas não revela destino nem data para transferência do acervo Comissão encontrou prateleiras com acervo já embalado para traslado (Acervo pessoal)

Movimento contrário ao fechamento do espaço denuncia falta de diálogo. Endereço na rua da Praia terá “novo uso”, que tampouco é informado pelo poder público

As prateleiras da biblioteca central da Secretaria Municipal da Educação, com mais de 50 anos de história, estão sendo esvaziadas aos poucos, sem que perguntas essenciais sejam respondidas pela prefeitura. Enquanto os  8.300 volumes vão sendo empacotados em grandes embalagens de papel pardo para serem encaminhados a “escolas municipais, pinacotecas e arquivos de Porto Alegre”, parlamentares e representantes de bibliotecários e escritores denunciam falta de diálogo e descaso com o acervo. Segundo esse grupo, não há detalhes sobre como será feita a divisão dos volumes, nem a garantia de que coleções sejam preservadas como fonte de consulta e pesquisa.

“É um acervo de referência que está sendo completamente diluído na rede, os volumes estão sendo distribuídos indiscriminadamente. Professores que queiram desenvolver um trabalho específico em literatura gaúcha, afro-brasileira ou indígena, que antes recorriam à biblioteca central para ter acesso ao conjunto das obras, não terão mais essa possibilidade”, lamenta o presidente da Associação Gaúcha de Escritores (AGES), Alexandre Brito. 

No início de maio, o tradicional espaço, na rua dos Andradas, nº 680, recebeu a visita de uma comissão composta pelo vereador Matheus Gomes (Psol), coordenador da Frente Parlamentar em Defesa do Livro, da Leitura e da Escrita da Câmara Municipal, e Neli Miotto, presidente da Associação Riograndense dos Bibliotecários. No local, eles encontraram materiais jogados ao chão e livros “empacotados sem nenhum cuidado”, segundo relataram à reportagem. Também não havia nenhum funcionário responsável por zelar pela correta armazenagem e traslado dos volumes.

“É uma ação de desrespeito e desvalorização com todas essas obras, muitas delas conservadas ali há meio século”, lamenta Gomes. 

Materiais já estão acondicionados, mas grupos críticos à prefeitura dizem não saber para onde vão (Acervo pessoal)

A prefeitura anunciou o encerramento das atividades da biblioteca da Smed, no dia 08 de abril, argumentando que falta público para o local, fechado desde o ano passado em razão da pandemia. O argumento, entretanto, é questionado pelo grupo que se opõe à extinção da biblioteca. “Será uma perda de memória coletiva para comunidade de Porto Alegre. É preciso incentivar, cultivar e cativar o interesse pelo espaço, não fechá-lo”, condena Miotto. Em fevereiro, a gestão de Sebastião Melo (MDB) também decidiu desalojar a biblioteca da Smam para abrigar em seu lugar um escritório de licenciamento, mas voltou atrás depois que uma mobilização reuniu entidades ambientalistas, bibliotecários e funcionários públicos em defesa da manutenção do espaço.

A Smed confirma que há planos de destinar a sede da biblioteca para “novo uso”, mas não informa qual. Tampouco revela a data em que os livros, já acondicionados em pacotes, serão trasladados. “Não há um prazo estabelecido para essa movimentação ”, limitou-se a escrever, por e-mail, a assessoria de imprensa da pasta à reportagem. Sequer os novos endereços onde poderá ser feita a consulta é especificado: “Futuramente, o destino dos volumes será informado, para possibilitar a organização das referidas memórias, a quem se interessar”.

Uma das preocupações por parte das entidades é a falta de diálogo. Segundo relatam os entrevistados, a prefeitura chegou a proibir a entrada de Gomes no local, em uma oportunidade em que ele visitaria o espaço acompanhado de Sofia Cavedon (PT) e Fernanda Melchionna (PSol), que assim como ele, presidem comissões parlamentares do livro e da leitura respectivamente na Assembleia Legislativa do Estado e no Congresso Nacional.

Já Miotto revela que a secretaria acenou com a criação de um grupo de trabalho com as entidades, para debater como seria feita a redistribuição do acervo. Mas, mais de um mês depois, essa promessa não foi cumprida.

A AGES emitiu um comunicado rogando à prefeitura que estabelecesse uma política de mais transparência sobre o destino dos livros e do espaço da biblioteca central. “Solicitamos que as mudanças em curso sejam pausadas para darem lugar a um diálogo qualificado com a sociedade civil, que resguarde a importância deste espaço para as políticas públicas de leitura da Capital, e, especialmente, que preserve o acervo de referência existente”, diz um trecho do ofício.

Mas segundo o vereador Matheus Gomes, “não há intenção de reverter o processo de diluição dos acervos por parte da administração pública”.

Uma preocupação especial é com o acervo do projeto Adote um Escritor – e com a continuidade do programa que aproxima estudantes da rede municipal dos autores gaúchos. Segundo Brito, “o QG” do Adote um Escritor era a sede da biblioteca e não há informação sobre como será sua continuidade fora do espaço. “A gente vem tentando saber o que vai ser feito desse programa e nunca tivemos informações muito claras. Sabemos que há uma conversa entre a secretaria e Câmara Riograndense do Livro para dar continuidade, mas nada mais concreto”, se ressente Brito.

Em seu site, a Smed garante que “a mudança não inviabiliza o programa” e diz que um “espaço cultural” será criado para abrigar parte do acervo.

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