Carta da Editora

A surpresa de Leite

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A surpresa de Leite Muçum foi um dos municípios mais afetados pelas enchentes | Foto: Maurício Tonetto/Secom-RS

O governador Eduardo Leite perdeu a linha na Globonews. Ao ser confrontado por André Trigueiro, jornalista experiente e especialista na cobertura de meio ambiente, se exaltou e acusou o repórter de “falta de empatia” por simplesmente apontar que já passou da hora das autoridades se dizerem surpresas diante de eventos extremos como as chuvas que mataram mais de 40 pessoas no Rio Grande do Sul.

A GZH, Leite já havia dito que não era o momento de apontar culpados quando questionado sobre os avisos emitidos pelo governo. Mas os bons jornalistas estão aí em busca de respostas que façam diferença na vida das pessoas e não para agradar os entrevistados. E não tem nada a ver com empatia. Eu tenho certeza que não falta sensibilidade a Trigueiro nem ao governador em relação aos milhares que perderam tudo o que tinham, sem contar os mortos. Há diversos relatos na imprensa que dão conta da dimensão da tragédia na vida das vítimas.

O que não existe é hora errada de se questionar como chegamos até aqui e o que será feito daqui pra frente para prevenir ou amenizar os efeitos da catástrofe climática. Porque infelizmente vai acontecer de novo. 

Por exemplo: o que foi feito desde as cheias de 2020, que deixaram milhares de desalojados no Vale do Taquari, região mais afetada pelo ciclone desta semana? A população que mora nas Ilhas em Porto Alegre tem sido devidamente alertada sobre possíveis inundações? Quantas árvores mais a capital gaúcha vai derrubar e quantos estacionamentos serão construídos até a prefeitura se dar conta de que está indo na direção inversa à de uma cidade sustentável? Quando as gestões de Leite e Sebastião Melo vão entender que as tragédias que vêm acontecendo o Rio Grande do Sul não são um fenômeno meramente natural?

Mais uma reportagem da Matinal chega a Brasília

Um projeto de lei apresentado na Câmara dos Deputados no final de agosto começou a ser desenhado em uma parceria da Matinal com estudantes de jornalismo em abril do ano passado.

Sob coordenação da repórter Naira Hofmeister e da professora Marília Gehrke, alunos do MBA em Jornalismo de Dados do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) mostraram que as câmaras municipais das capitais brasileiras falham em conceder acesso a informações públicas e facilitar o controle social dos cidadãos.

Essa reportagem chegou às mãos da deputada federal Adriana Ventura (Novo) e ajudou a embasar o PL protocolado no dia 25 de agosto. O texto define requisitos para a transparência ativa no poder legislativo. Se aprovado, as câmaras municipais e assembleias legislativas deverão divulgar informações básicas como contato dos gabinetes parlamentares – dados que, no nosso levantamento, não foram encontrados em todas as capitais – até gastos individualizados com verbas indenizatórias, incluindo auxílios e reembolsos com despesas médicas.

A transparência é um tema caro à nossa redação. Em 2021, outra reportagem da Naira, ao lado do Pedro Papini, mostrou que a Câmara de Porto Alegre havia ignorado quase metade dos pedidos de informação feitos por cidadãos. Antes mesmo da sua publicação, após contato da reportagem com a casa, houve recorde de respostas concedidas em um único dia.

Neste ano, Pedro Nakamura mostrou que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul estava restringindo acesso a salários de magistrados. A pauta levou o Conselho Nacional de Justiça a intimar a corte.

Outros impactos

A reportagem sobre as câmaras municipais foi mais uma produção da Matinal que chegou a Brasília, mostrando a importância do jornalismo local.

No mês passado, nossa cobertura sobre o Dia do Patriota foi assunto no Superior Tribunal Federal e fez até o ministro da Justiça se manifestar. Em 2021, a revelação sobre o uso irregular de proxalutamida no Hospital da Brigada Militar em Porto Alegre levou a Anvisa a rever normas de importação para pesquisas.

Aqui em Porto Alegre, já são diversos os impactos das nossas reportagens. Nesta semana, voltamos ao caso da obra na Usina do Gasômetro, fechada desde 2017. Em 2021, uma matéria nossa – também em parceria, dessa vez com o Nonada e o Dossiê Palcos Públicos – mostrou falhas na fase de projetos da reforma, que está super atrasada e já custa o dobro do orçado inicialmente. O Ministério Público iniciou imediatamente uma investigação, que segue em andamento, e agora a Prefeitura informou que, enfim, vai abrir uma sindicância, após ter encerrado uma fase preliminar de apuração.

Nosso jornalismo ajuda a transformar a cidade e o país. Uma reportagem por vez.


Marcela Donini é editora-chefe na Matinal.
Contato: [email protected]

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