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Você sofre de ansiedade climática?

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Você sofre de ansiedade climática? Região das ilhas de Porto Alegre foi bastante afetada pelas chuvas | Foto: César Lopes / PMPA

Os brasileiros estão cada vez mais preocupados com a crise climática. Quem atesta é o todo-poderoso Google, que anunciou que as buscas pela expressão “ansiedade climática” cresceram 73 vezes nos últimos cinco anos.

Ainda que não tenha nomeado essa sensação, é possível que você também se pergunte com cada vez mais frequência onde vamos parar com tantas transformações no clima. 

Os gaúchos estão encerrando um ano cheio de eventos extremos históricos. Começamos 2023 com mais um período de estiagem e chegamos em dezembro depois de pelo menos três desastres provocados por ciclones, altos volumes de chuvas e consequentes inundações que desalojaram milhares de pessoas e mataram mais de 70.

Ficou ansioso? Espera que tem mais.

A crise climática, assim como foi com a pandemia, escancara desigualdades sociais históricas em países como o Brasil. Quem mais sofre são os de sempre: os mais pobres e as mulheres

Reduzir os danos provocados por eventos climáticos passa por solucionar problemas crônicos como acesso à moradia digna e um modelo de desenvolvimento das cidades que não mais destrua a natureza.

Deu taquicardia? Aqui sim.

É a ansiedade climática somada à ansiedade por viver no Brasil.

Essas questões foram abordadas na noite de quarta-feira, durante o painel promovido pela Matinal sobre a emergência climática e o futuro das cidades. Henrique Evers, gerente de desenvolvimento urbano do WRI Brasil e um dos palestrantes, destacou que a agenda climática se impõe a cada vez mais gente, seja quem vê a água invadindo sua casa com mais frequência ou os gestores públicos que são cobrados por soluções.

Assim como Evers, Francisco Milanez, diretor científico da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), também destacou a importância de colocar a natureza no centro das soluções para os problemas urbanos impostos pela crise climática – que, por sua vez, vem sendo provocados por esse modelo destruidor de desenvolvimento das cidades, segundo os dois painelistas.

Milanez trouxe ainda um outro ponto importante. “Equilíbrio ambiental e saúde, que são a mesma coisa, não geram nenhum real pra ninguém. Mas toda desgraça gera muito dinheiro. Se a destruição for acompanhada de leis para recuperação, gera ainda mais dinheiro”. Para ele, entender esse “processo perverso” é fundamental para abandonar uma postura ingênua frente à pauta ambiental. “Se a gente não entende que a desgraça dá lucro e a solução não dá, a gente parte de uma ingenuidade básica. E quem pode querer soluções que não dão lucro? Só a cidadania”, disse Milanez. 

É preciso mobilizar a sociedade para a ação. A pressão popular ainda tem efeito sobre os tomadores de decisão nas cidades. Neste ano, Porto Alegre testemunhou essa força de novo em pelo menos um momento: quando a prefeitura desistiu de conceder a Redenção para a iniciativa privada.

Aos ansiosos de plantão, uma boa notícia: é possível converter esse combo de ansiedade em uma pulsão por um novo modelo de vida, mais saudável, conectado com a natureza e com o vizinho. A ansiedade nos prepara para “agir de forma a evitar desastres futuros”, afirma Tracy Dennis-Tiwar, diretora do Laboratório de Regulação das Emoções da Faculdade Hunter em Nova York. 

Assim como a natureza é a cura para o futuro das cidades, depois de anos considerada uma vilã que precisou ser dominada, a ansiedade pode ser a força que nos levará à sobrevivência.


Marcela Donini é editora-chefe da Matinal.
Contato: [email protected]

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