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Ciclone: atendimento da CEEE piorou com demissões, diz sindicato

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Ciclone: atendimento da CEEE piorou com demissões, diz sindicato Foto: Luciano Lanes/PMPA

Passados cinco dias do evento climático extremo, quase 4 mil pontos seguiam sem luz no Rio Grande do Sul. Além da demora, clientes relatam problemas para acessar atendimento da concessionária

Na quarta-feira, cinco dias depois do ciclone extratropical que atingiu o Rio Grande do Sul, cerca de 3,8 mil unidades seguiam sem energia elétrica na área de abrangência da CEEE Grupo Equatorial, de acordo com o mais recente boletim publicado pela concessionária. As áreas ainda às escuras estavam localizadas sobretudo na Região Metropolitana de Porto Alegre e no Litoral Norte do estado.

“Dia após dia eles me mandam esperar, sem perspectiva de retorno da energia. Diversos alimentos estragaram na geladeira e amanhã completo uma semana morando no escuro”, descreveu um morador de Porto Alegre no site Reclame Aqui. “Até este momento de meu relato, exatamente às 21h18 deste dia 20 de junho, ainda estou sem luz”, publicou outro morador da Capital. A página registra 180 reclamações contra a CEEE Grupo Equatorial nos últimos cinco dias, com a categoria “demora na execução” marcada como mais frequente.

O professor Jéferson Righetto, morador do bairro Partenon, conta que vem enfrentando problemas com a concessionária desde sexta-feira – embora a luz tenha sido religada para quase toda a região em que mora, vive um “calvário” entre os canais de atendimento da empresa. “Primeiro para conseguir a chamada telefônica. Após conseguir o registro, eles cancelaram, alegando que já teria sido atendido, que a luz estaria restabelecida. Já se vão cinco dias completos sem energia a pleno na residência. Eles não atendem e não conseguem dar previsão”.

Ele havia buscado contato por SMS, por WhatsApp e telefone. “Hoje, então, fui à loja física da Azenha. A dificuldade é muito grande. O atendimento é demorado, e, quando se chega lá, dão a mesma explicação utilizada nos outros canais. A supervisora garantiu que viriam operadores nesta quarta-feira, o prazo expirou, e a companhia não se responsabiliza por nada”, protesta.

O evento climático extremo que atingiu o Rio Grande do Sul foi um dos maiores desastres meteorológicos da história do estado: dezesseis pessoas morreram, com dois milhões de pessoas afetadas. A agilidade da concessionária de energia elétrica – em um contexto de aquecimento global, no qual esses fenômenos crescem em frequência e intensidade – é questionada não somente por moradores das áreas afetadas, mas também por trabalhadores do setor.

Sete meses depois do processo de privatização, a CEEE Grupo Equatorial realizou, em outubro de 2021, um plano de desligamento voluntário (PDV) que culminou na saída de 998 trabalhadores. Essa é uma das razões apontadas pelo eletricitário Antonio Jailson Silveira, presidente do Sindicato dos Eletricitários do Rio Grande do Sul, para a deficiência do serviço. Segundo ele, as demissões impactaram “enormemente” os serviços prestados à população. “Muitos trabalhadores com experiência e qualificação aderiram [ao PDV]”, argumenta.

“As atividades estão sendo atendidas por empresas terceirizadas, das quais recebemos diariamente reclamações de trabalhadores, envolvendo precarização do trabalho, baixos salários, não pagamento de horas extras, com descontos indevidos e poucas horas de formação para trabalhar. Em uma atividade de alto risco, como são os serviços em energia elétrica, isso reflete diretamente nos trabalhos prestados pela concessionária”, disse o presidente do sindicato. 

A empresa, por outro lado, diz que há uma mescla do conhecimento de “funcionários da CEEE enquanto estatal com o know-how do Grupo Equatorial Energia”. Até o fim do ano passado, de acordo com a concessionária, aproximadamente 1,6 mil funcionários, entre próprios e terceirizados, foram contratados para serviços de obras, serviços de campo, comerciais, fiscalizações e plantões de atendimento.

MP tem inquérito aberto sobre atendimento e fornecimento

Em março de 2022, depois de uma tempestade que deixou 45 mil unidades sob concessão da CEEE Equatorial sem luz por três dias, o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) abriu inquérito – ainda em andamento – para apurar as dificuldades na área abrangida pela empresa. São três focos de atuação: “melhora nos canais de acesso para atendimento ao consumidor, tanto em agências digitais quanto físicas, falta e imprecisão de informação prestada ao usuário, e demora no restabelecimento de energia elétrica após interrupção”, conforme enumera a promotora Ivana Kist Huppes Ferrazo.

Também a Defensoria Pública do Estado participou da audiência, no ano passado, e segue colhendo relatos a respeito das falhas no serviço. “Nos últimos dias, tivemos alguma demanda mais acentuada, especialmente comunicando a falta de energia elétrica em regiões mais afetadas e a eventual demora, em alguns pontos, no restabelecimento do serviço”, relata o defensor Rafael Magagnin. “As reclamações mais recentes dizem respeito à suspensão no fornecimento de energia elétrica, mas também estão ligadas a questões que envolvem a regularização do consumo, a cobrança retroativa e a algum desajuste no valor das faturas mensais de consumo”, diz.

Reforçando os relatos de problemas enfrentados pelos consumidores, o sindicato dos eletricitários diz que as dificuldades passam também pela terceirização das atividades de atendimento e da automatização de respostas em canais virtuais. “Isso leva o consumidor a se deslocar a uma agência, enfrentar enormes filas para pedir uma segunda via da fatura ou mudança de titularidade, é o que podemos verificar na prática, basta ir na agência do bairro Azenha, em horário de pico”, descreve o presidente da entidade.

A CEEE Grupo Equatorial contrapõe, em nota enviada ao Matinal: “alguns desses canais, assim como aplicativos de transporte e outros serviços, fornecem estimativas de prazos de atendimento. Especificamente no caso do call center, ele é humanizado, com mais de 200 atendentes e transbordo com outros três call centers do Grupo Equatorial em outras regiões em situações de congestionamento”. A empresa diz que normalizou, nos quatro dias depois do ciclone, o fornecimento de energia para 418 mil unidades consumidoras, o que representa 22% de toda a concessão da companhia.

Para a entidade que representa os eletricitários, entretanto, trata-se de um problema cuja origem é a própria venda da CEEE, em março de 2021. “O número de trabalhadores com experiência diminuiu muito após a privatização”, diz Silveira. “As empresas têm a premissa de maximizar seus lucros e diminuir os custos, e essa conta quem paga é o consumidor”, finaliza. 

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