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Airton Ortiz: Na Trilha de Jesus

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Airton Ortiz: Na Trilha de Jesus Era um santo desafio: percorrer a Trilha de Jesus, uma caminhada de 70 km entre Nazaré e Cafarnaum, passando pelos lugares bíblicos onde Jesus pregou aos discípulos e fez alguns dos seus milagres. Não seria uma peregrinação, nenhum de nós é religioso, mas uma expedição cultural formada por seis amigos para eu escrever um livro de aventuras; essa região da Galileia é de difícil acesso, e o caminho tem um certo grau de dificuldade. Essa era a ideia original. Era. Ao longo da jornada, estipulada para ser vencida em 4 dias, passaríamos por Canaã (onde Jesus fez seu primeiro milagre, transformando água em vinho), Migdal (aldeia natal da Maria Madalena), Monte das Bem-aventuranças (onde Jesus pregou o Serão da Montanha e multiplicou os pães e peixes), Mar da Galileia (onde Jesus andou sobre as águas) e Cafarnaum (onde morou na casa de Pedro e estabeleceu a base do seu ministério). É uma região que, segundo a Bíblia, Jesus percorria com assiduidade. Estimulante. Embora a grande simbologia mística, nosso desafio era mais físico do que qualquer outra coisa. E deveria render uma boa história, ambientada em um lugar emblemático da saga cristã. Era o que pensávamos, nós seis, eu em especial; mas não foi bem assim. Ah, e como foi diferente! Este ano tínhamos um agravante: o tal de coronavírus. O demônio vinha assustando crentes e incrédulos. Judeus, árabes e turistas, especialmente no interior, sofriam restrições em seus movimentos impostas pelos governos locais. Nós mesmos, na semana anterior, fomos impedidos de entrar em Belém. Quatro turistas foram encontrados infectados em um hotel e a autoridade palestina resolveu fechar a cidade, ninguém entrava nem saía. O mesmo aconteceu com Jericó. Por sorte eu conhecia essas cidades. Meus amigos não. Mas uma aventura deve ser uma aventura. E lá nos fomos, contrariando alguns. Que colocamos na conta dos mais assustados. Embora não devêssemos. Mas isso só descobriríamos nos dias seguintes. Saímos da Basílica da Anunciação, em Nazaré, construída sobre as cavernas onde José tinha a sua carpintaria, morada também da Sagrada Família, e mourejamos cidade acima, subindo 406 degraus por suas ruelas irregulares até deixá-la para trás. As mochilas pesavam mais do que deviam, mas não sabíamos o que tínhamos pela frente. Melhor prevenir. Uma grande ideia. Cruzamos um vale pedregoso, com muitas escorregadelas, e saímos em meio a uma pequena floresta. Desabou um aguaceiro; ficamos uma meia-hora embaixo das árvores, junto com algumas vacas que também se protegiam da chuva; mas nada que nossas roupas impermeáveis não pudessem suportar. Continuamos pelo barro, subimos pela encosta de uma montanha sem fim e saímos na entrada do Parque Nacional Zippori, onde poderíamos ver belos mosaicos bizantinos. Deixamos de lado, nosso tema era Jesus. Continuamos ladeando um antigo aqueduto romano, dobramos à direita, subimos por outra encosta; dobramos à esquerda, subimos por mais uma encosta; alguém do grupo lembrou que Jesus andava num burrinho. Tinha razão. Mas em nosso caso os burros de carga eram nós mesmos, então sem piadinhas pagãs. Sabe como é: pelo […]

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Era um santo desafio: percorrer a Trilha de Jesus, uma caminhada de 70 km entre Nazaré e Cafarnaum, passando pelos lugares bíblicos onde Jesus pregou aos discípulos e fez alguns dos seus milagres. Não seria uma peregrinação, nenhum de nós é religioso, mas uma expedição cultural formada por seis amigos para eu escrever um livro de aventuras; essa região da Galileia é de difícil acesso, e o caminho tem um certo grau de dificuldade. Essa era a ideia original. Era. Ao longo da jornada, estipulada para ser vencida em 4 dias, passaríamos por Canaã (onde Jesus fez seu primeiro milagre, transformando água em vinho), Migdal (aldeia natal da Maria Madalena), Monte das Bem-aventuranças (onde Jesus pregou o Serão da Montanha e multiplicou os pães e peixes), Mar da Galileia (onde Jesus andou sobre as águas) e Cafarnaum (onde morou na casa de Pedro e estabeleceu a base do seu ministério). É uma região que, segundo a Bíblia, Jesus percorria com assiduidade. Estimulante. Embora a grande simbologia mística, nosso desafio era mais físico do que qualquer outra coisa. E deveria render uma boa história, ambientada em um lugar emblemático da saga cristã. Era o que pensávamos, nós seis, eu em especial; mas não foi bem assim. Ah, e como foi diferente! Este ano tínhamos um agravante: o tal de coronavírus. O demônio vinha assustando crentes e incrédulos. Judeus, árabes e turistas, especialmente no interior, sofriam restrições em seus movimentos impostas pelos governos locais. Nós mesmos, na semana anterior, fomos impedidos de entrar em Belém. Quatro turistas foram encontrados infectados em um hotel e a autoridade palestina resolveu fechar a cidade, ninguém entrava nem saía. O mesmo aconteceu com Jericó. Por sorte eu conhecia essas cidades. Meus amigos não. Mas uma aventura deve ser uma aventura. E lá nos fomos, contrariando alguns. Que colocamos na conta dos mais assustados. Embora não devêssemos. Mas isso só descobriríamos nos dias seguintes. Saímos da Basílica da Anunciação, em Nazaré, construída sobre as cavernas onde José tinha a sua carpintaria, morada também da Sagrada Família, e mourejamos cidade acima, subindo 406 degraus por suas ruelas irregulares até deixá-la para trás. As mochilas pesavam mais do que deviam, mas não sabíamos o que tínhamos pela frente. Melhor prevenir. Uma grande ideia. Cruzamos um vale pedregoso, com muitas escorregadelas, e saímos em meio a uma pequena floresta. Desabou um aguaceiro; ficamos uma meia-hora embaixo das árvores, junto com algumas vacas que também se protegiam da chuva; mas nada que nossas roupas impermeáveis não pudessem suportar. Continuamos pelo barro, subimos pela encosta de uma montanha sem fim e saímos na entrada do Parque Nacional Zippori, onde poderíamos ver belos mosaicos bizantinos. Deixamos de lado, nosso tema era Jesus. Continuamos ladeando um antigo aqueduto romano, dobramos à direita, subimos por outra encosta; dobramos à esquerda, subimos por mais uma encosta; alguém do grupo lembrou que Jesus andava num burrinho. Tinha razão. Mas em nosso caso os burros de carga eram nós mesmos, então sem piadinhas pagãs. Sabe como é: pelo […]

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