Crônica

Porto Alegre no refrão

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Porto Alegre no refrão Foto: Marcelo Viola/PMPA

As pessoas que decidiram nomear Porto Alegre como Porto Alegre talvez não pensaram nisso, mas essas duas palavrinhas parecem dar liga em refrões musicais.

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Tem aquela do Fogaça, também conhecida como “melô do Zaffari”, com uns versos que os interioranos acham ambíguos: Porto Alegre é demais.

É que no interior gaúcho tem uma diferença entre demais com i (dimais) ou com e (demais). 

Dimais seria sem dúvidas algo bom. Repare como o e se empolgou e passou a imitar o i: dimais tem dois bracinhos erguidos em comemoração. 

demais significa algo que ultrapassou os limites. O que pode ser bom (o outono é demais) ou nem tanto: chover uma semana seguido é demais. No interior, seria estranho alguém dizer que “chover uma semana seguido é dimais”. 

Então essa do Fogaça deixa a gente na dúvida: Porto Alegre é tri ou se passou?

Mas pra quem é do interior são outras as canções que vêm à mente quando se fala em Porto Alegre: Deu pra ti baixo astral, vou pra Porto Alegre, tchau, e Porto Alegre é longe, tô pegando o ônibus pra te encontrar.

A primeira vê Porto Alegre como um lugar perto, um lugar pra onde a gente pode ir quando dá vontade. A segunda olha pra Porto Alegre como um lugar que, putz, tem que pegar um ônibus… Tem que se planejar… 

Deu pra ti é dos anos 1980. Foi composta por pelotenses. Pelotas é uma das cidades gaúchas mais famosas, tem até universidade pública. O pessoal de lá fala que nem os bonfinenses. Pelotas é um bairro porto-alegrense que fica a três horas do centro. 

Pegando o ônibus é dos anos 1990. Foi composta por um sananduvense. Sananduva fica ali como quem tá indo pra Cacique Doble, na zona metropolitana de Lagoa Vermelha. O ônibus pra Porto Alegre é semi-direto (esses eufemismos) e leva em média sete horas.

Além de falarem sobre Porto Alegre, tem outra coincidência entre essas duas canções: ambas foram compostas por versões brasileiras de Claytons. A primeira, por Kleiton Ramil (com o mano dele) e a segunda por Cleiton Borges, do Musical JM.

Esse Cleiton fez também aquela Feliz aniversário, feliz aniversário que talvez tenha parado de tocar nos carros de som que as pessoas contratavam pra constranger os parentes nos bairros, mas continua tocando naquela parte do cérebro inviolável: a parte onde se alojam as músicas que a gente não esquece, ou porque são demais, ou porque são dimais.

Não sei se alguém ainda faz música pra Porto Alegre, não sei nem se alguém ainda faz música, mas fica a dica. Bota Porto Alegre no refrão que é capaz de dar certo.


Paulo Damin é tradutor e escritor, autor de Adriano Chupim (Martins Livreiro). Publicou na Parêntese o folhetim A lenda do corpo e da cabeça.

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