Sem (re) volta, ou sem a volta
Aos dezoito anos, na passagem autorizada para o grupo daqueles que respondem por si, ganhou do pai um revólver. Ao mesmo tempo experimentou orgulho, medo e repulsa diante do presente. O pai sorriu, olhando firme, à espera de gratidão. Um abraço sem palavras encerrou o embaraço e a arma já ficou na cintura, onde permaneceria por mais de quatro décadas. O ritual foi repetido com os irmãos, como um destino do qual não se foge. A mãe estava sempre junto, nas passagens do tempo e no dia a dia do trabalho, dando sua parcela ao fazer contatos e ajudar nos recados. Ela circulava mais, sem muita preocupação.
O tráfico era a família e a família era o tráfico. O entra e sai de pessoas desconhecidas em sua casa não era estranho, assim como as mudanças de endereço que precisaram acontecer. Sobrinhos e filhos ingressaram e repetiram a história, que alcança três gerações. Então, não era problema o sumiço temporário do pai, do irmão ou de algum primo ou tio. Já sabia que se tratava de uma proteção para que o clã se mantivesse, e em breve haveria o retorno. Não havia dissidências, deslealdade ou alguma insurgência, porque a filiação estava desde sempre anunciada como um destino.
[Continua...]