Ensaio

COP27: um pequeno respiro no meio do apocalipse climático

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COP27: um pequeno respiro no meio do apocalipse climático Para qualquer internacionalista, estar em um evento nas proporções da Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) é a realização de um sonho ou, no mínimo, a certeza de que o diploma serviu para alguma coisa. As grandes expectativas logo são confrontadas com o marasmo de 30 anos de convenções climáticas e poucos avanços concretos. Porém, nesta COP, um passo fundamental foi dado em prol da reparação histórica dos países ricos em relação aos pobres, que significou um respiro para ativistas climáticos no Brasil e no mundo.  Participei desta última COP27 como uma das representantes do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), organização não governamental em que trabalho há quatro anos com orçamento público e direitos humanos. Fomos para o evento com a expectativa de levar nossos debates sobre subsídios aos combustíveis fósseis, mercado de carbono, transição energética e financiamento de políticas para povos indígenas. A COP se organiza em dois espaços: a zona onde acontecem as negociações formais entre os diplomatas, representando seus Estados, e o espaço dedicado à sociedade civil, onde se misturam países, empresas, movimentos sociais, bancos de desenvolvimento, entre outros. Basicamente, todo mundo que quer dizer algo sobre clima, e tem como pagar, se reúne anualmente na COP. Isso significou, nesta COP27, mais de 30 mil pessoas, um recorde de participação que se traduz em uma pegada ecológica astronômica – uma das grandes contradições deste evento. Minha atuação se deu principalmente no espaço da sociedade civil, mas o caminho para o acompanhamento das negociações é em geral desimpedido, pois apenas conversas bilaterais e os tópicos mais quentes possuem restrições. Isso é um retrato do que a ONU representa em termos de democracia, cooperação e solidariedade internacional. Ela é a única organização internacional em que praticamente todos os países estão presentes e têm o mesmo poder de voto. Enquanto G20, OCDE e FMI têm já em suas diretrizes a disparidade de poder entre as nações, a ONU tem em seu princípio originário a ideia de que todos devem ter lugar à mesa e que os direitos humanos são compartilhados por todos no mundo – ainda que não possamos esquecer o Conselho de Segurança da ONU, que também é um exemplo da divisão global de poder.  Junto com suas visões idílicas, a ONU vem carregada de inoperância. Todo mundo lembra de suas tentativas frustradas de impedir a Guerra no Iraque, para citar um exemplo. Mas as negociações sobre o clima são o grande exemplo de sucesso da organização, principalmente devido ao Acordo de Paris, criado em 2015. Neste acordo, 194 países prometem realizar esforços para manter o aumento da temperatura da terra “muito abaixo” de 2 graus, têm metas de redução de emissão de gases do efeito estufa e, talvez mais importante, concordam com o princípio das “responsabilidades comuns porém diferenciadas”. Tal mote determina que os países desenvolvidos devem arcar com os custos maiores para o desenvolvimento sustentável, dado que foram eles que historicamente mais contribuíram para a crise climática atual, […]

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Para qualquer internacionalista, estar em um evento nas proporções da Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) é a realização de um sonho ou, no mínimo, a certeza de que o diploma serviu para alguma coisa. As grandes expectativas logo são confrontadas com o marasmo de 30 anos de convenções climáticas e poucos avanços concretos. Porém, nesta COP, um passo fundamental foi dado em prol da reparação histórica dos países ricos em relação aos pobres, que significou um respiro para ativistas climáticos no Brasil e no mundo.  Participei desta última COP27 como uma das representantes do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), organização não governamental em que trabalho há quatro anos com orçamento público e direitos humanos. Fomos para o evento com a expectativa de levar nossos debates sobre subsídios aos combustíveis fósseis, mercado de carbono, transição energética e financiamento de políticas para povos indígenas. A COP se organiza em dois espaços: a zona onde acontecem as negociações formais entre os diplomatas, representando seus Estados, e o espaço dedicado à sociedade civil, onde se misturam países, empresas, movimentos sociais, bancos de desenvolvimento, entre outros. Basicamente, todo mundo que quer dizer algo sobre clima, e tem como pagar, se reúne anualmente na COP. Isso significou, nesta COP27, mais de 30 mil pessoas, um recorde de participação que se traduz em uma pegada ecológica astronômica – uma das grandes contradições deste evento. Minha atuação se deu principalmente no espaço da sociedade civil, mas o caminho para o acompanhamento das negociações é em geral desimpedido, pois apenas conversas bilaterais e os tópicos mais quentes possuem restrições. Isso é um retrato do que a ONU representa em termos de democracia, cooperação e solidariedade internacional. Ela é a única organização internacional em que praticamente todos os países estão presentes e têm o mesmo poder de voto. Enquanto G20, OCDE e FMI têm já em suas diretrizes a disparidade de poder entre as nações, a ONU tem em seu princípio originário a ideia de que todos devem ter lugar à mesa e que os direitos humanos são compartilhados por todos no mundo – ainda que não possamos esquecer o Conselho de Segurança da ONU, que também é um exemplo da divisão global de poder.  Junto com suas visões idílicas, a ONU vem carregada de inoperância. Todo mundo lembra de suas tentativas frustradas de impedir a Guerra no Iraque, para citar um exemplo. Mas as negociações sobre o clima são o grande exemplo de sucesso da organização, principalmente devido ao Acordo de Paris, criado em 2015. Neste acordo, 194 países prometem realizar esforços para manter o aumento da temperatura da terra “muito abaixo” de 2 graus, têm metas de redução de emissão de gases do efeito estufa e, talvez mais importante, concordam com o princípio das “responsabilidades comuns porém diferenciadas”. Tal mote determina que os países desenvolvidos devem arcar com os custos maiores para o desenvolvimento sustentável, dado que foram eles que historicamente mais contribuíram para a crise climática atual, […]

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