Entrevista

Júlio Zanotta – Um absurdo

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Júlio Zanotta – Um absurdo Foto: Gilberto Perin

Uma parte substantiva da história cultural de Porto Alegre, desde a ditadura até agora, passa pela ação do nosso entrevistado de hoje. Júlio Zanotta Vieira é o nome da fera.

Para a minha geração, que estava na universidade na segunda metade dos anos 1970, ele despontou como autor de algumas das primeiras montagens do grupo, aliás, Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz, até hoje em ação, quarenta e cinco anos depois – confira lá em https://www.oinoisaquitraveiz.com.br. Aliás, ele conta, na entrevista, uma parte de seu grande envolvimento naquele momento.

Mas a vida do Júlio tem lances daquelas biografias movimentadas. Para ficar apenas no mundo local, lá pelas tantas ele retorna à cena como dono de sebo que foi famoso, e por isso se filiou à Câmara Riograndense do Livro e dela acabou virando presidente, o que significa dizer que foi peça-chave na Feira do Livro, primeira metade dos anos 1990. 

Foi um momento realmente impressionante, que talvez os mais novos não imaginem. Para dar um exemplo: a Feira era as barracas, uns fios de eletricidade e iluminação a céu aberto, e era isso. Chovia e era um horror. Até que o Júlio liderou a primeira experiência de cobertura das alas da Feira, coisa que se tornou corriqueira e agora absolutamente necessária.

Agora, com nova loja de livros usados – a livraria Absurda, na Borges, 1033, quase esquina da Demétrio Ribeiro, pertíssimo do Capitólio –, ele ressurge de suas próprias entranhas para lançar nada menos que dez livros com seu teatro, mais um romance. Tudo vai comentado aqui de modo breve e, como deveria, irreverente. 

Grande Júlio. 

(Outro dia eu conto da minha participação na vinda do popstar em ascensão Paulo Coelho à Feira.)

Luís Augusto Fischer 


Parêntese – Lançar dez volumes da tua dramaturgia de uma vez só, aliás numa linda edição: como se pode interpretar este gesto? Fé na humanidade? Desespero? Urgência?

Júlio Zanotta – Foi um gesto casual, uma viagem nas nuvens ou pouco mais que uma viagem na areia. Me reuni em São Paulo com Alex Giostri, proprietário da Editora Giostri, coloquei sobre a mesa dele os meus textos e disse: olha, eu tenho isto para publicar. Ele olhou, chamou a editora-chefe e respondeu: ok, vamos publicar. A Giostri é uma grande editora, pouco conhecida aqui no RS. São especializados em dramaturgia brasileira, editaram cerca de 400 (isto mesmo, 400) dramaturgos nacionais. Tem uma estrutura enorme. Possuem livrarias em várias cidades, teatros, sala de eventos, um café muito concorrido, etc.

A Giostri editou 10 volumes do meu teatro, contendo 8 textos longos e 30 breves. Também editou duas novelas, “O Caralho Voador” e “Pisa Leve”. 

Parêntese – Tua trajetória é cheia de lances interessantes. No teatro, teu começo foi escrevendo para as primeiras encenações do Oi Nóis Aqui Traveiz? Aquela dramaturgia misturando crítica política com irreverência e alguma coisa de perversidade tu encontraste sem maior dificuldade? Tiveste algum autor de referência? Ele ou eles se mantêm ainda como referências para ti?

JZ – Não só escrevi para o grupo. Fui um dos fundadores. Aluguei o prédio no meu nome, sendo a minha mãe a fiadora, o que me causou depois sérios problemas, pois o local (era uma boate) ficou praticamente demolido. A crítica política com a irreverência e a contundência das montagens atraiu a ira dos agentes da ditadura. Fomos violentamente reprimidos. Os fatos são bem conhecidos e há registros abundantes na imprensa da época. Foram encenados dois textos de minha autoria: “A Divina Proporção” e “A Felicidade Não Esperneia, Patati-Patatá”. Para mim, seguem como referência. Um trata da especulação imobiliária e outro é um olhar cínico sobre a nêmesis da medicina.

Sempre trabalhei com a fantasia solta. Neste sentido, Kafka e Ionesco foram um revestimento para as minhas pirações. No entanto, minhas reais expressões simbólicas afirmavam-se em torno de uma concreta figuração: a cruel ambiguidade e o sentido oculto do jogo político da época.


(Gilberto Perin

Parêntese – Tu tiveste uma vivência no exterior, nos anos 70. Como foi aquele tempo? 

[Continua...]

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