Folhetim

A lenda do corpo e da cabeça – Capítulo 3: Uma cabeça sem corpo

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A lenda do corpo e da cabeça – Capítulo 3: Uma cabeça sem corpo
(No capítulo anterior, vimos o corpo cair no açude do Ardelino e depois sair cambaleando na direção do mato) Quando acordou, estava na beira da água. Endireitou-se, tentou ajeitar os cabelos com a língua e falou: – Quem é tu, água mole? – Sou uma sanga anônima. E tu, cabeça dura? Com receio de parecer privilegiada, embora no momento não passasse de uma pobre cabeça perdida, ela preferiu não revelar seu próprio nome e disse apenas: – Sem meu corpo, nem sei quem sou. Aliás, viu ele por aí? – Hoje, por mim, não passou nenhum sem cabeça – disse a sanga. – Me dá uma carona? Estou com preguiça de ir rolando – disse a cabeça. E foi descendo a correnteza lenta da sanguinha. Ia com os olhos voltados para a pança do céu. A cabeça tinha esperança de ver seu corpo voando, pois achava que os corpos decapitados ficavam tão leves que eram levados pelo vento. Encontraram o Arroio Capivara. A sanga anônima cumprimentou seu velho amigo e apresentou a caroneira.  – Viu meu corpo por aí? – perguntou a cabeça. – Hoje, por mim, não passou nenhum sem cabeça – disse o Arroio Capivara. – Me dá uma carona? Estou com preguiça de ir rolando – disse ela. Despediu-se da sanga, que prometeu informá-la caso visse o corpo. E lá foi a cabeça no Arroio Capivara, olhando fixo para a pança do céu, contando as estrelinhas que começavam a aparecer.  A cabeça sabia que os seres, quando morrem, transformam-se em luzes voadoras. Ficou muito contente ao perceber que o número de estrelas continuava o mesmo. Era sinal de que seu corpo continuava vivo, à sua procura. Paulo Damin é tradutor e escritor, autor de Adriano Chupim (Martins Livreiro).

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