Folhetim

A vida e a vida de Áurea – Capítulo 7

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A vida e a vida de Áurea – Capítulo 7 Foto: Theo Tajes

Camas separadas, beijos sem calor

No capítulo anterior: a crise no casamento da Áurea e do  Larry se aprofunda com a falta de interesses em comum. Em mais uma discussão, ele diz à mulher que faria qualquer coisa para não perdê–la, e os dois terminam no consultório da doutora Rosaura, terapeuta de casais. Então a Áurea bota o Grêmio na conversa e o Larry se revolta. É por uma bobagem dessas que o casamento deles está no cai–não–cai?

A separação era questão de tempo, embora o Paulinho e o Miro fizessem de tudo para convencer a mãe de que ela estava se precipitando.

– Precipitando? São 35 anos de patadas. De piadas. De desfeitas.

– O casamento de vocês não é tão ruim assim. Olha a família maravilhosa que vocês construíram. 

– …

– E os bens de vocês. Essa casa!

– E aquele Gol vermelho que eu odeio e o Larry não troca por nada.

– Mãe, o pai não vai se recuperar se tu for embora. Vai ser o fim dele.

Uma mãe não deve tirar as ilusões dos filhos, a Áurea pensou ao ouvir o argumento do Paulinho. Ela sabia, e a história estava aí para provar, que homem separado não fica sozinho por muito tempo. O Larry ainda dava um caldo, embora a barriguinha avantajada que ele tiodopavemente chamava de calo sexual. Ela apostaria em dois meses como o prazo máximo para ele se enrabichar por alguma percanta. 

Mais uma vez, e ela já havia perdido a conta de quantas tinham sido ao longo de 35 anos de casamento, a Áurea decidiu ficar. Mas foi bem clara: chacotas sobre a aparência dela e de suas amigas, sobre o que ela gostava e, principalmente, sobre o Grêmio, nunca mais queria ouvir. O Miro e o Paulinho se olharam, era difícil que o pai se lembrasse dessa advertência por mais de um dia. Mais provável que levasse o ultimato na piada e continuasse a fazer suas graças sem graça na tentativa de arrancar uma gargalhada da mulher. De todo jeito, lá se foram os dois em missão solene para assinar o tratado e selar a paz entre o pai e a mãe. Que fez mais uma exigência: queria uma televisão na cozinha para ver o que lhe desse na telha, já que passava a maior parte do dia lá mesmo. E smart, para ter Netflix e Youtube sem precisar conectar isso e aquilo.

O próprio Larry foi comprar a TV com ela e fez questão de levar a melhor 32 polegadas que a loja oferecia. O que ele não esperava era que, de noite, a Áurea pegasse o travesseiro e uma cobertinha e avisasse que, de agora em diante, dormiria no quarto que foi dos guris.

– Tu não acha que já é exagero?

– É para garantir que tu vai cumprir o que prometeu.

– E o que dormir junto tem a ver com isso?

– Tu não lembra daquela peça que a gente viu nos anos 80, Lisístrata?

– Lisístrata? Sobre o que era?

– Vai te informar que tu entende. Boa noite.

Talvez fosse exagero viver na mesma casa que o marido sem dormir com ele, que sempre lavava os pés antes de deitar e não roncava. Mas a Áurea queria se certificar de que o Larry cumpriria o prometido. O namoro sempre a amolecia e não era hora de dar mole. Ela precisava ter certeza de que ele respeitaria o acordo.

Na manhã seguinte, o Larry um doce, os dois sentados tomando o café com ovos mexidos que ele preparou. Verdade que a Áurea não fazia questão de ovos mexidos, mas também se achava na obrigação de fazer concessões para uma nova vida em paz. Foi quando ela pegou o jornal e viu na capa, manchete principal: Grêmio contrata Luisito Suárez. Isso e mais os detalhes da grande festa de apresentação em janeiro.

O Larry já tinha visto, mas ficou na dele. Se desfizesse da contratação, perigava a Áurea ir embora para nunca mais. Se desse os parabéns, ela acharia que era deboche e iria embora também.

A Áurea tirou os olhos do jornal, encarou o Larry e disse:

– Eu vou.

O Larry olhou no fundo dos olhos dela e falou, do jeito mais convincente de que foi capaz:

– Eu te levo.

No próximo capítulo: Hat–trick é amor


Claudia Tajes é escritora e roteirista.

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