Capítulo 5: Resistiré a uma hermana argentina como companheira de quarto?
No dia que se seguiu ao filmaço do sol indo embora tutelado por histórias protagonizadas pelo povo do teatro de sombras pelo avesso, ancora no espetaculoso quarto de Ella uma nova habitante: Lenora, a argentina que fala demais, como rapidamente ficaria conhecida se o remédio não freasse logo a vibe da fase maníaca da sua bipolaridade anunciadíssima, solta aos quatro ventos.
Fez questão logo de cara de avisar por que estava ali. Em seguida estendeu sorridente a mão para Ella dizendo o nome, Lenora, com uma disposição que não combinava com a tragédia mais do que anunciada que era estar ali. Ella pensou que poderia dar problema dizer seu nome para o poço de alegria e falta de limites que se esparramava a sua frente. Não adiantaria trocar de nome, seria desmascarada por um ou outro colega de andar loguinho. A demora para revelar o nome foi cutucada por um impaciente ¿Cómo te llamas? quase gritado, acompanhado de uns olhos arregalados e de um gesto inquiridor regido pelas mãos que não entendiam a falta de vontade de falar da outra. E vencida pela insistência:
– Ella.
– ¿¿¿Fitzgerald???
– Se tu prefere, que assim seja… Mas esta aqui é só da Silva mesmo.
– ¿¿¿ Así como Lula da Silva???
– Sim, alguma coisa contra ele? Melhor não ter, já vou te avisando.
Lenora disse que não, era uma simpatizante das mais fervorosas tanto de Lula, quanto de Ella, a Fitzgerald. Calou a boca por uns instantes para o alívio de Ella. Aquilo prometia, resmungava por dentro. Ao menos não era uma bolsomínia negacionista, ufa… No quarto anterior que Ella ocupava, as duas companheiras estavam com depressão daquelas de quase se arrastar pelo chão, não falavam, portanto. Ella lamentava o sofrimento das duas, mas agradecia ao silêncio quase sacrossanto que aquelas dores geravam. Agora teria de enfrentar um rio abaixo em dia de enchente… A recém-chegada perguntou por que Ella estava ali. Depressão?
[Continua...]