Portas Porto Alegre 6: Extensão clandestina
Enquanto o Achei! fosse seu guia, nada lhe faltaria – a não ser o telefone propriamente dito. Ter um em casa era caro, caro, caro: totalmente proibitivo. Recorria aos orelhões pra contatos cotidianos e às cabines da CRT quando a previsão de uma conversa alongada pedia alguma privacidade.
Comprava as fichas de interurbano no balcão, logo à entrada após os cinco degraus – tivesse entrado pela Salgado Filho ou pela Borges – serviço rápido toma lá, dá cá, mas a fila única já fazia dobra, antecipando-se à impaciência durante o longo tempo de espera entre as 15 cabines de cada parede. No vão retangular que separava as 30 conversas simultâneas – cá e lá, só silêncio e choro –, Úrsula se integrava à compulsória sala de escuta de histórias interurbanas em discagem direta a distância sem que ninguém ali demonstrasse interesse.
As pessoas na fila aparentavam um desinteresse coletivo pelo que se ouvia das cabines, os olhares desviando-se reciprocamente em um quase acordo tácito necessário à delimitação de fronteiras entre o espaço público onde se enfileiravam os corpos e as histórias privadas que transitavam ali.
[Continua...]