Mistérios parciais de Porto Alegre | Parêntese

Gunter Axt: Bares, confeitarias e um tango para Flores da Cunha

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Gunter Axt: Bares, confeitarias e um tango para Flores da Cunha [Este passeio é uma continuação do texto Cafés, combates e um saboroso bife com ovo, publicado na edição 33 da Parêntese.] Largo dos Medeiros, 1910-1929 (ao fundo, o Café Colombo). Fotografia de Virgilio Calegari. Museu Joaquim José Felizardo – Fototeca Sioma Breitman À noite, a rua da Praia se agitava com os bares. Nos anos 1920 e 1930, badalava-se no Salatino, no Florida e no Antonello. O Bela Gaúcha ficava ao lado da Livraria do Globo: em uma das mesas, Lupicínio Rodrigues compôs mais tarde “Boneca de Doce”. O Franciscano localizava-se na rua Sete de Setembro e tinha nas paredes telas representando grupos de frades medievais. Na rua do Rosário (convertida em Otávio Rocha) ficava o Odalisca. O Eduardo, cuja especialidade era Hackepeter, um bife tártaro feito com carne crua, situava-se na rua Dr. Flores. O Zeppelin era na Hoffman com São Carlos; o Rheingold, perto do Coliseu. O Breustübel ficava na praça dos Bombeiros, com ambiente enfumaçado onde pontificava sobre um poleiro uma arara tagarela. O Hubertus foi instalado na praça Otávio Rocha, tendo na parede uma pintura em sépia do santo protetor da caça. Fora do eixo da rua da Praia ficava ainda o restaurante Dona Maria, na rua José Montaury, nos fundos da Galeria Chaves, estabelecido em 1938 por uma sociedade de Maria Hopf com Ernesto Moser, que fora ecônomo do Chalé da Praça XV, charmosa construção em aço desmontável, madeira, vidro e lindos ladrilhos hidráulicos, em estilo meio bávaro, meio art nouveau, onde as crianças enlouqueciam com os sorvetes e gasosas, enquanto estudantes, artistas e boêmios em geral replicavam o mantra “noch ein Chopp” ao velho Fritz e demais garçons alemães. Na Confeitaria Central, tomava-se chá com torradinhas à tarde. O garçom Antônio era cheio de atenções com os clientes, cujos pedidos antecipava de cor. Na enchente de 1941, quando foi preciso se locomover com embarcações na rua da Praia, ele quase se afogou tentando ajudar os vizinhos, como o do Cartório Mariach, mergulhando para salvar livros de tabelionato. Ficou revoltado quando lhe ofereceram uma recompensa em dinheiro. Então, em segredo, os amigos se juntaram para comprar-lhe uma casinha no Menino Deus. Até o prefeito Loureiro da Silva entrou na vaquinha. Houve um tempo em que as casas que vendiam bebidas não podiam funcionar depois da meia-noite. Mas, a despeito disso, os três irmãos Medeiros, proprietários, sempre atrás do balcão de gravatinha borboleta, vendendo docinhos e empadinhas, mantinham a Central aberta, em consideração aos amigos. As multas foram se empilhando e acabaram criando uma dívida com o município que inviabilizaria o negócio. Tomando conhecimento disso, o prefeito Loureiro da Silva mandou cancelar a cobrança, pois a Central era um patrimônio da cidade. Prova do carinho que se tinha pelos irmãos é que em 1957 a Câmara de Vereadores oficializou uma homenagem que todos já faziam oralmente, referindo-se àquele trecho da rua da Praia, entre a General Câmara e a praça da Alfândega, como largo dos Medeiros. A Central se comunicava por uma passagem com a Confeitaria […]

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[Este passeio é uma continuação do texto Cafés, combates e um saboroso bife com ovo, publicado na edição 33 da Parêntese.] Largo dos Medeiros, 1910-1929 (ao fundo, o Café Colombo). Fotografia de Virgilio Calegari. Museu Joaquim José Felizardo – Fototeca Sioma Breitman À noite, a rua da Praia se agitava com os bares. Nos anos 1920 e 1930, badalava-se no Salatino, no Florida e no Antonello. O Bela Gaúcha ficava ao lado da Livraria do Globo: em uma das mesas, Lupicínio Rodrigues compôs mais tarde “Boneca de Doce”. O Franciscano localizava-se na rua Sete de Setembro e tinha nas paredes telas representando grupos de frades medievais. Na rua do Rosário (convertida em Otávio Rocha) ficava o Odalisca. O Eduardo, cuja especialidade era Hackepeter, um bife tártaro feito com carne crua, situava-se na rua Dr. Flores. O Zeppelin era na Hoffman com São Carlos; o Rheingold, perto do Coliseu. O Breustübel ficava na praça dos Bombeiros, com ambiente enfumaçado onde pontificava sobre um poleiro uma arara tagarela. O Hubertus foi instalado na praça Otávio Rocha, tendo na parede uma pintura em sépia do santo protetor da caça. Fora do eixo da rua da Praia ficava ainda o restaurante Dona Maria, na rua José Montaury, nos fundos da Galeria Chaves, estabelecido em 1938 por uma sociedade de Maria Hopf com Ernesto Moser, que fora ecônomo do Chalé da Praça XV, charmosa construção em aço desmontável, madeira, vidro e lindos ladrilhos hidráulicos, em estilo meio bávaro, meio art nouveau, onde as crianças enlouqueciam com os sorvetes e gasosas, enquanto estudantes, artistas e boêmios em geral replicavam o mantra “noch ein Chopp” ao velho Fritz e demais garçons alemães. Na Confeitaria Central, tomava-se chá com torradinhas à tarde. O garçom Antônio era cheio de atenções com os clientes, cujos pedidos antecipava de cor. Na enchente de 1941, quando foi preciso se locomover com embarcações na rua da Praia, ele quase se afogou tentando ajudar os vizinhos, como o do Cartório Mariach, mergulhando para salvar livros de tabelionato. Ficou revoltado quando lhe ofereceram uma recompensa em dinheiro. Então, em segredo, os amigos se juntaram para comprar-lhe uma casinha no Menino Deus. Até o prefeito Loureiro da Silva entrou na vaquinha. Houve um tempo em que as casas que vendiam bebidas não podiam funcionar depois da meia-noite. Mas, a despeito disso, os três irmãos Medeiros, proprietários, sempre atrás do balcão de gravatinha borboleta, vendendo docinhos e empadinhas, mantinham a Central aberta, em consideração aos amigos. As multas foram se empilhando e acabaram criando uma dívida com o município que inviabilizaria o negócio. Tomando conhecimento disso, o prefeito Loureiro da Silva mandou cancelar a cobrança, pois a Central era um patrimônio da cidade. Prova do carinho que se tinha pelos irmãos é que em 1957 a Câmara de Vereadores oficializou uma homenagem que todos já faziam oralmente, referindo-se àquele trecho da rua da Praia, entre a General Câmara e a praça da Alfândega, como largo dos Medeiros. A Central se comunicava por uma passagem com a Confeitaria […]

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