Entrevista | Parêntese

Identidade gaúcha, natureza, mulher e medo da morte

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Identidade gaúcha, natureza, mulher e medo da morte
O destino das pessoas é, em boa medida, um mistério. Também assim é a trajetória dos grandes livros. Livro de qualidade pode não vender na hora, pode ser best-seller ali adiante, pode demorar gerações para ser entendido. Mas e o que pensar de um grande livro que não foi publicado? Este pode ser o ponto de partida ideal para a leitura da entrevista com a antropóloga Ondina Fachel Leal. Agora aposentada, ela defendeu um doutorado de enorme valor há trinta anos – sim, uma geração atrás. E esse trabalho ainda não ganhou a forma majestosa do livro.  Antes de saber por quê, vale saber como ele é. O trabalho se chama, traduzido ao português, Gaúchos: cultura masculina e identidade nos pampas. Era uma tese doutoral na Universidade da Califórnia em Berkeley, ano de 1989. Nasceu, como a entrevista vai contar, de uma pergunta um tanto inesperada, lá para aquele tempo: dado o sucesso dos festivais de canção regionalista daquele momento – antes da internet, antes mesmo da televisão chegar a todos os cantos –, como os gaúchos lá dos fundos dos campos estariam recebendo a nova interpretação cultural da identidade gauchesca?  (Para fazer um eco adequado para esse trabalho, vale conhecer Terra adentro, relato de uma viagem feita a cavalo por três amigos, em março de 1980. O texto, publicado uma vez em jornal no mesmo ano, veio a conhecer uma correta encarnação em livro apenas em 2006. O ponto de interesse dos amigos era convergente – averiguar se lá nos fundos de campo a televisão já tinha chegado. Veja a resenha.) A pesquisadora mergulhou na busca de respostas, visitando e mesmo vivendo numa estância do Alegrete e também outra em Artigas, no lado uruguaio da fronteira. Mas o que começou a ver era muito mais interessante e complexo. Começou a abrir-se para ela o mistério do galpão, um mundo sem mulheres, um mundo de trabalho que era também a forja da identidade cultural em sentido amplo, um mundo de valentia e briga, finalmente, e surpreendentemente, um mundo de suicídio.  Essa é uma simplificação da riqueza do trabalho, mas é também um roteiro das descobertas e das formulações que Ondina soube construir e escrever. Estava com a publicação em vista, mas o destino se encarregou de armar uma de suas trampas. O livro permanece inédito até hoje, e eu tenho certeza de que essa não-existência pública em forma de livro fez diferença na nossa compreensão do fenômeno. Diferença para menos, é claro. Ano passado retomei o exemplar em papel da tese, que tinha ganhado da Ondina lá em 1989, e voltei a me maravilhar. Há a descrição etnográfica detida, há a retomada de um momento significativo da história cultural no estado e há, com certa surpresa, nas linhas e entrelinhas, uma serena visada crítica feminina, de formato científico mas de alma feminista, que é uma maravilha.  A entrevista foi feita no dia 19 de dezembro passado e revista pela entrevistada e pelo entrevistador agora em fevereiro.  — Luís Augusto Fischer […]

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