Inéditas e Novidades

KUNHUN, GÁ, JỸKRE

Change Size Text
KUNHUN, GÁ, JỸKRE Foto: Ricardo Chaves/arquivo pessoal (do website do Cimi)

A foto em destaque retrata Nelson Xangrê e o povo Kaingang, em meio às lutas pela retomada de seu território tradicional, em 1978.

História e Memória das Retomadas Kaingang no Rio Grande do Sul

“Retomada para nós, povos indígenas, significa não deixar morrer os nossos antepassados.”

(Mulheres Kaingang em luta na retomada Kandóia)

As recuperações territoriais, retomadas ou autodemarcações são estratégias políticas utilizadas por grupos indígenas do país e em toda América Latina. São ações diretas de caráter anti ou decolonial diante do descumprimento pelos Estados e pelos órgãos indigenistas das suas responsabilidades, como a demarcação das terras indígenas e o fim da violência e da invasão de seus territórios tradicionais.

No fim da década de 1970, indígenas de várias etnias se organizam para retomar os seus territórios invadidos. Foram emblemáticas as retomadas Kaingang de Rio das Cobras (PR), liderada por Ângelo Kretã, e de Nonoai (RS), liderada por Nelson Xangré. Na década de 1980, os movimentos indígenas de todo Brasil participaram ativamente das discussões políticas do fim da Ditadura Civil-Militar, da formulação da Constituição Cidadã de 1988. Na Carta Magna, pela primeira vez na história do Brasil, consta, no Artigo 231:

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

Em tempos que esses direitos são atacados de todas as maneiras, diversos povos recorrem à sua própria luta para garanti-los. Entre estes, o povo Kaingang, que habita tradicionalmente o Planalto Sul-Brasileiro, guardião das florestas endêmicas de Araucárias, tão características da paisagem da região.

Ao retomar territórios, os Kaingang estão recuperando a terra () e também os seus modos de viver, as memórias, os saberes e fazeres, práticas, palavras e sentimentos dos antigos (Jỹkre). Conhecimentos que foram oprimidos por mais de duzentos anos de tutela, quando o trabalho forçado, os castigos, a perseguição à língua e à religião tradicionais eram comuns.

Como apontou a antropóloga Clémentine Maréchal (2021), esse povo conta a história da colonização de seu território a partir de dois momentos: o “tempo do amansamento”, que começa em meados do século XIX com a chegada de europeus e com a implementação dos aldeamentos, a partir de 1846; e o  “tempo do cativeiro”, quando os Kaingang foram submetidos a um regime de controle social, exploração da terra e do trabalho, violência e miséria, devido à implementação da tutela pelo Serviço de Proteção ao Índio e Localização dos Trabalhadores Nacionais (SPILTN, depois denominado apenas de SPI).

Nos anos de 1970, com a extinção do SPI em meio a denúncias de corrupção e violências dos seus agentes, as lideranças Kaingang começam a se organizar,  reunir-se e articular reações ao arrendamento e à entrada de posseiros em seus territórios. Dessa forma, nas décadas de 1970 e 1980, ocorrem as primeiras retomadas, em Nonoai (foto) e no Paraná, a partir de lideranças como Nelson Xangrê e Ângelo Kretã. A força dessas lideranças permanece na memória e no espírito de luta do povo Kaingang, enquanto continua a perseguição e a invasão de suas terras.

Essa exposição mostra – com fotografias, vídeos e objetos – aspectos da luta e resistência Kaingang através dos processos de retomada nas regiões do Alto Uruguai, do Oeste do Paraná e da Serra Gaúcha. Tais processos apontam tanto a recuperação da terra quanto da história. Por isso, essa exposição, que parte de um trabalho de pesquisa colaborativa entre os Kaingang e os pesquisadores, traz à tona a memória como um motor da luta pela terra e da resistência anticolonial.


Clémentine Maréchal, antropóloga

Guilherme Maffei Brandalise, historiador

Maurício Venh Tain, liderança de Konhun Mág

ASSINE O PLANO ANUAL E GANHE UM EXEMPLAR DA PARÊNTESE TRI 1
ASSINE O PLANO ANUAL E GANHE UM EXEMPLAR DA PARÊNTESE TRI 1

Esqueceu sua senha?

ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.
ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.