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“Angela” coloca o feminicídio na tela e no debate

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“Angela” coloca o feminicídio na tela e no debate Bravura Cinematográfica/Divulgação

Exibido na competição do recente 51º Festival de Gramado, o filme Angela (2023) chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (7/9). O longa dirigido por Hugo Prata é focado nos últimos meses de vida da socialite mineira Ângela Diniz (Isis Valverde) e nas consequências de uma conturbada relação amorosa com o empresário Raul Fernando do Amaral Street (Gabriel Braga Nunes), o Doca Street, que culminou em um dos casos de feminicídio mais chocantes e famosos do país.

A história acompanha a trajetória de Ângela Diniz (1944 – 1976) a partir de sua mudança para o Rio de Janeiro, após uma tumultuada separação do marido em Belo Horizonte na qual teve que ceder a guarda dos três filhos para conseguir o desquite. Envolvida com o colunista social Ibrahim Sued (Gustavo Machado), Ângela conhece em uma festa Raul, então casado com a rica expoente da sociedade carioca Adelita (Carolina Mânica).

Ângela e Raul iniciam um relacionamento amoroso intenso, que os leva a morarem juntos em uma casa na praia no litoral fluminense. O idílio a dois, porém, rapidamente vai se deteriorando à medida em que Raul começa a se mostrar um homem agressivo, violento e controlador. A relação declina para o abuso e a violência, culminando com o covarde assassinato de Ângela com quatro tiros de revólver disparados por Raul – três no rosto e um na nuca.

Bravura Cinematográfica/Divulgação

O elenco conta ainda com Alice Carvalho, Bianca Bin, Chris Couto e Emílio Orciollo Netto. Angela é o segundo longa de Hugo Prata, diretor também de Elis (2016) – cinebiografia que ultrapassou a marca de 500 mil ingressos vendidos e foi premiada em Gramado em categorias como melhor filme do júri popular e atriz (Andréia Horta).

Um dos pontos positivos de Angela são as ótimas atuações, inclusive do elenco de apoio. Isis Valverde destaca-se imprimindo dramaticidade e intensidade à sedutora, atormentada e complexa personagem central.

O roteiro do filme, assinado por Duda de Almeida, não se debruça sobre o passado da protagonista antes do envolvimento com Raul, nem aborda os atribulados julgamentos posteriores do assassino e a comoção nacional causada pelo crime – aspectos decisivos para melhor entender a trajetória de Ângela Diniz e que foram detalhados no ótimo podcast Praia dos Ossos, de 2020. Segundo comentaram tanto o diretor quanto a roteirista em Gramado, a opção de privilegiar narrativamente o relacionamento com desfecho trágico de Ângela e Raul foi a maneira encontrada para não abordar episódios e aspectos da vida pessoal da vítima que foram explorados de maneira sensacionalista na época dos julgamentos do assassino a fim de desqualificá-la perante o júri e a opinião pública.

Bravura Cinematográfica/Divulgação

A exibição de Angela no festival serrano dividiu opiniões, suscitando críticas distintas: alguns reprovaram a abordagem sobre a sexualidade da protagonista encarnada por Isis Valverde, que consideraram uma fetichização da figura feminina; já outros argumentaram que as circunstâncias do crime e o caráter de seu perpetrador deveriam ser mais explicitamente condenados pelo filme.

De qualquer maneira, o certo é que o feminicídio de Ângela Diniz acabou se transformando em um verdadeiro marco da luta das mulheres brasileiras contra a violência doméstica, deflagrando um movimento nacional de protesto com o lema “Quem ama não mata” – resposta à argumentação da defesa da Doca Street de que ele “matou por amor”. A pressão feminista levou a um novo julgamento, já que da primeira vez o assassino saiu livre do tribunal depois de receber uma pena mínima.

Passados quase 47 anos do crime, o tema da violência contra a mulher continua na pauta: por unanimidade de votos, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou no começo de agosto inconstitucional o uso da tese da legítima defesa da honra em crimes de feminicídio ou de agressão contra mulheres – informação acrescentada nos letreiros finais de Angela.

Bravura Cinematográfica/Divulgação

Angela: * * *

COTAÇÕES

* * * * * ótimo     * * * * muito bom     * * * bom     * * regular     * ruim

Assista ao trailer de Angela:

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