Juremir Machado da Silva

Negócios gaúchos

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Negócios gaúchos No dia 23 de janeiro, foi concretizada a venda da Carris para a empresa Viamão | Foto: Alex Rocha/PMPA

A sensação que se tem é simples: Porto Alegre e o Rio Grande do Sul estão à venda. Não interessa quem é o comprador, o negócio é negociar, passar nos trocos, livrar-se do bagulho, privatizar. A CEEE foi vendida a troco de banana de má qualidade para a Equatorial, que se mostrou ótima para gerir em causa própria e com tempo bom. O único problema é a necessidade de entregar o serviço e de enfrentar temporal. No balcão dos negócios municipais, a Carris foi comprada pela poderosa Viamão. Depois de muita conversa sobre capital internacional, tecnologia de ponta, inovação e outras enrolações do gênero, foi a moderníssima Viamão que arrematou a velha Carris.

A Viamão está para a modernidade em transporte público assim como as marchinhas de carnaval de antigamente estão para o funk. Se o negócio não dá certo, com o serviço piorando, o vendedor tranquiliza: é só questão de tempo, de ajuste, de adaptação. Se duvidar, acusa o cidadão, convertido em cliente, de não ser moderno e não saber lidar com a dinâmica da atividade privada, que precisa, antes de lucrar, pois, afinal, o lucro não é pecado e toda crítica é coisa de gente anacrônica ou de comunista mesmo. Tem comprador, desses por tempo determinado, que já sai cortando árvore. Como se sabe, árvores atrapalham o progresso. Para que ficar com árvores quando se pode ter a maior roda gigante do país, do continente, enfim, de algum lugar?

Matinal informa: “Capital social de empresa líder de consórcio que fez proposta pelo Cais Mauá não chega a 0,1% do mínimo exigido por edital”. Explica: “No site da Receita Federal, Spar declara ter R$ 10 mil de capital social, mas estado exige mais de R$ 130 milhões do consórcio interessado”.  Só pode ser erro do site. Para que se preocupar com esse tipo de detalhe. O importante é fazer negócio. Nos leilões gaúchos, em geral, só tem um interessado. É o leilão de candidato único. Assim dá menos trabalho para definir o vencedor.

Quem compra, devasta ou demite, que é outra forma de devastar. A poderosa Viamão já mandou embora 87 funcionários. Estava no pacote. A ideia é sempre a mesma: fazer mais com menos. A Equatorial vendeu essa lorota. Por enquanto, tem feito muito menos com mais tempo sem energia. O governador, porém, acha que melhorou. O prefeito não se arrependeu do voto que deu quando era deputado. Vender dá prazer. Sou contra privatizações? Não. Há privatizações razoáveis. Transporte público, água e energia são outros quinhentos. A Europa fez e recuou.

Vender é fácil. Ainda mais flexibilizando requisitos. Gerir é outra história. Em breve, nada mais existirá para vender. Que programa de governo apresentarão os que só sabem privatizar? Há muito se sabe que o melhor para uma comunidade é o equilíbrio entre iniciativa privada e gestão pública. Defender patrimônio público nada tem a ver com partido único, propriedade coletiva dos bens de produção ou inexistência de propriedade privada. Os países escandinavos estão aí para exemplificar o que estão dizendo. Mas nem precisa ir tão longe. Basta ficar com França e Alemanha mesmo. Ao rifar Carris o pessoal deve ter cantado a plenos pulmões: que sirvam nossas façanhas…

Tambor tribal (Dono da lua)

Aos vinte anos decidi mudar o mundo,
Pois faltava espaço para meus sonhos.
Queria conquistar a lua e sair de casa,
Não necessariamente nessa ordem.
Se as ideias porventura eram curtas,
Longos e revoltos eram meus cabelos,
Que tremulavam como minha bandeira,
Enquanto meu vizinho sargento dizia:
A tua hora vai chegar, bom cabelo!
Se acaso eu não tinha eira nem beira.
Queria ir direto ao centro de tudo,
O coração da bela Maria Carolina
E uma conta no bar da esquina.
Então eu botei o pé na estrada.
Levava na mala um casaco de linho,
Um livro de poesia e o retrato da mãe.
Além da carteira de trabalho limpinha.
Não sabia se precisava para astronauta.
Quando voltei, trinta anos depois,
O mundo já era totalmente outro,
Sem considerar minha contribuição.
Soube que Maria Carolina era avó.
Eu trazia um caderno de poesia,
E a carteira de trabalho ainda vazia.
Sempre preferi a informalidade.

Parêntese da semana

Parêntese #211: Psicanálise, Ortografia e Carnaval”. Ziriguidum. Luísa Kiefer: “Hoje temos dois novos nomes por aqui. Evandro Machado Luciano é psicanalista e no seu texto de estreia na Parêntese fala sobre o suposto saber ou por que acreditamos naquilo que acreditamos. Seus ensaios prometem trazer meandros da psicanálise além de reflexões e pensamentos sobre a América Africana.  Gabriel de Ávila Othero fala de ortografia de modo descomplicado. Quem nunca se pegou pensando se estender era com S ou com X? Em seu texto, o professor de linguística da UFRGS decifra alguns dos erros comuns que cometemos e dá pinceladas da complexa história da nossa língua”. 

Frase do Noites

O iluminista pós-apagão e em tempos de privatização acelerada: “Quem vende o que tem, não compra o que precisa”

Imagens e imaginários

No Pensando Bem, que vai ao ar todo sábado, 9 horas, na FM Cultura, 107,7, em parceria com Matinal, revista Parêntese e Cubo Play, e apoio da Adufrgs Sindical, Nando Gross e eu entrevistamos Roger Lerina, consagrado jornalista cultural gaúcho, um dos pilares da Matinal. Um belo papo sobre cinema, música e jornalismo.

Escuta essa

Nos dias 9 e 10 de fevereiro, no FonFon (Vieira de Castro 22), tem CarnaGlau, o carnaval de salão com a cantora Glau Barros.

Vamos ao esquenta:

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