Parêntese #111: Aviso
Ele chega e pode mudar o rumo da coisa. Para bem ou para mal. Para cima ou para baixo. O aviso.
Por muitos séculos a vida dependeu de quem sabia interpretar os avisos da natureza e do além – um trovão, um barulho, uma palavra, qualquer coisa podia ser tomada como a revelação do futuro. Para os católicos, ocorreu mesmo um caso extremo, na figura do grande escritor e padre (escritor porque padre) Antônio Vieira.
Na altura de 1650 ele começou a escrever uma História do futuro, que viria a conhecer a forma impressa apenas após sua morte – o livro viu a luz em 1718, mais de vinte anos após o desaparecimento do autor.
Nela, Vieira escrevia, sem qualquer apreensão pelo paradoxo do título, o que viria a acontecer com Portugal, que ele imaginava vir a ser a sede de um Quinto Império mundial, depois dos assírios, persas, gregos e romanos. Errou, como se sabe, ainda que aquele pequeno país tenha de fato feito algo inesperado entre os séculos 15 e 17.
O que importa é, em qualquer dos casos, ter em mente o aviso – o capítulo 8 do folhetim da Milena Friedrich Cabral relata um aviso que dificilmente poderia ser mais dramático.
Três avisos costumam anteceder o começo da função teatral. Ali está a plateia, comendo pipoca ou olhando o celular, e apita uma, duas, três vezes, apaga-se a luz e então tudo o que importa está no palco: a magia se reitera, o mundo real fica entre parênteses, a respiração agora está com os atores, que já não são mais os CPFs da vida diária, mas projeções de nós mesmos.
A entrevista desta semana é com Luciano Alabarse, consagrado diretor teatral, gestor cultural e grande figura pública. Ele conta parte de sua trajetória e compartilha uma fatia generosa de suas múltiplas experiências.
A reportagem fotográfica de Carlos Edler sobre a excelente exposição de Sioma Breitman também serve de aviso – há, na redondeza, uma notável coleção de grandes figuras a redescobrir, como o fotógrafo que aqui desenvolveu sua arte.
Em imagens também a edição 111 – esse número cabalístico que algum místico do passado ou charlatão do presente poderia tomar como um aviso, sabe-se lá de quê – traz um ensaio de figuras e corpos nas obras de Daniela Reis.
O já clássico trabalho de Arnoldo Doberstein visita agora a arborização da praça da Matriz. Taiane Beduschi repõe criticamente a história de um prédio que agora vai abrir, naturalmente em inglês, um rooftop, antigamente conhecido como cobertura (mas em inglês vende melhor, para um certo público). O procurador do Estado Marcelo Ferreira Costa medita, com amargor, sobre o assassinato do jovem Moïse, que é francês para Moisés, o nome daquele personagem lendário que liderou uma grande imigração, como o jovem assassinado não vai mais poder fazer. Moïse que foi assunto do Matinal na coluna do Juremir Machado da Silva.
Um texto de grande interesse para a Parêntese, que quer sempre pensar sobre a cidade, é assinado por Álvaro Magalhães, sociólogo que acompanhou por dentro os congressos que Porto Alegre fez, anos atrás, para se pensar e conceber seu futuro. Estarão ainda válidas as teses daquele tempo?
Do Elenilton Neukamp, um criativo professor de Filosofia, publicamos a abertura de um conto, obra de ficção especulativa, sobre a morte de um presidente. Jandiro Koch resenha o novo livro de Guto Leite.
– Luís Augusto Fischer