Revista Parêntese

Parêntese #166: Dar a ver

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Parêntese #166: Dar a ver

Ver é trivial, ou parece trivial. Qualquer um olha e, se não tiver deficiência específica, vê o objeto. Se ampliarmos a ideia de “ver” para “tomar conhecimento”, bem, aí figura ainda mais elementar: qualquer um ouve, lê, sente, cheira, tateia, e o objeto em questão é apreendido. 

Mas não é bem isso e não é só isso. Para além do gesto individual, da iniciativa pessoal para apreender um objeto qualquer, estão aí os embaraços para acessá-lo. Embaraços elementares, como a falta de luz adequada, ou embaraços sutis, como as lentes ideológicas e as lentes culturais. 

Atuando como filtros no acesso aos objetos mas elas mesmas invisíveis, essas lentes fazem seu estrago o tempo todo. Exemplo recente? O bolsonarismo, ainda vivo e atuante. A nova bancada evangélica no Senado. O bloqueio à imprescindível discussão sobre a frase do hino rio-grandense, aquela que liga escravidão à falta de virtude – e isso num estado que acaba de libertar umas trezentas pessoas da condição escravagista de trabalho! 

(Um viva ao bloco de representantes negros na Assembleia Legislativa, que não se rende a esse reacionarismo que quer congelar para sempre os símbolos oficiais, impondo uma abominável cegueira mental.) 

Aí entra o serviço de dar a ver. A escola dá a ver. A informação dá a ver. A imprensa, a opinião pública, a leitura, a discussão dão a ver.

E quando esse empenho funciona, que beleza: veja a prezada leitora e o gentil leitor o ensaio de fotos da Nega Angela, apresentado pelo Fernando Schmitt: aqui, a tarefa de dar a ver tem estatuto de serviço público de primeira necessidade.

Na mesma linha operou a obra e a ação de Di Cavalcanti, apresentado na seção Galeria Breve pela Ana Carla de Brito, sempre precisa em seu esforço de dar a ver gente que deu a ver.

A entrevista com Airton Tomazzoni, coreógrafo e jornalista e agora autor de literatura, ilumina uns quantos cantos da experiência recente – a pandemia, o litoral, a perspectiva das crianças, tudo isso num livro que sai agora e merece atenção e se chama, como por acaso, Dentro do olho do peixe.

Arnoldo Doberstein segue contando coisas singulares que, sem a iluminação de seus textos, poderiam perfeitamente passar despercebidas. Como o folhetim do Tiago Maria, que nos bota dentro de outro inferninho e de tramas suspeitas, no capítulo 3 de sua história. 

Em sua coluna, Juremir se despede da exposição “Caminhos de Proust”, que encerra neste sábado na Biblioteca Pública. Para além desse adeus, também publica uma poesia e conta sobre um sonho curioso

Um ensaio de Homero Araújo e Tiago Schiffner relembra a montagem da Gota d’água [preta], todo um jeito de olhar para a cultura brasileira. Heloísa Netto traz a terceira das encarnações do Pinóquio fascista. E a Cláudia Tajes apresenta Viridiana, artista que voa com a voz. 

P.S.: para quem se interessa pela canção como força cultural, quarta que vem, às 18h, teremos o lançamento do livro Forma & Formação – uma conversa sobre a canção popular, da Editora da UFRGS, no Centro Cultural do campus central da universidade. O livro resulta de encontros ocorridos uns anos atrás entre o Luiz Tatit, grande pensador da canção, e este que vos escreve agora. 

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