Vista do pôr do sol sobre a Bacia Amazônica, fotografada com uma câmera de 35 mm do ônibus espacial Challenger, em órbita da Terra, em 1983. Foto: NASA

#180 | JULHO DE 2023

Vista do pôr do sol sobre a Bacia Amazônica, fotografada com uma câmera de 35 mm do ônibus espacial Challenger, em órbita da Terra, em 1983. Foto: NASA

– Tu não tá vendo o filme?
– Tô vendo. O quê que tem ele?
– Se tu tá escrevendo uma mensagem, não tá vendo o filme.
– Tô vendo, sim. Era só uma coisa meio urgente, tive que responder.
– Então agora pode largar o celular.
– Já vou, é que me marcaram num stories de trabalho. Deu, pronto, desligado.
– O filme acabou.
– Como assim acabou?
– É, enquanto tu escrevia mensagens e via stories, o filme acabou.
– O que aconteceu no final? Peraí.
– O que houve?
– Nada, só outra mensagem aqui, mas é rapidinho.
– E agora, acabou?
– Acabou o quê?

*

Resolvi começar esse editorial com uma pequena anedota sobre como, aposto eu, a maioria de nós tem passado o seu tempo: um pouco no mundo real, palpável, do toque e das relações ao vivo; e outro tanto no mundo virtual, na bolha da internet, navegando na multiplicidade de redes de relacionamento, de informação, de notícias, de memes, e a lista segue.

Na verdade, um pequeno ajuste deixaria a frase anterior mais precisa: como a maioria de nós fragmenta o seu tempo e a sua atenção. Os estímulos externos são muitos, mas, ainda assim, o ato de interromper o que quer que estejamos fazendo e olhar para o celular é uma decisão nossa. Isso está tão incorporado ao cotidiano que, na verdade, nem pensamos mais, apenas desviamos nosso foco, de forma automática, atraídos pelo brilho que emana das telas.

Se somos nós mesmos que causamos esses cortes e interrupções constantes ao longo do dia, então não temos por que estranhar a sensação geral – aquela que a gente percebe na conversa de elevador, no papo com o motorista do Uber, na parada esperando pelo ônibus, na padaria comprando pão – de que o tempo tem passado de forma cada vez mais veloz. Soma-se isso a máquina de poder hegemônico que tudo capitaliza, inclusive o nosso tempo. Ao final de cada ano, exclamamos com um quê de incredulidade: “esse ano passou ainda mais rápido!”. Será possível?

Como é dezembro e por aqui sentimos que “esse ano voou”, resolvemos dedicar essa edição para falar sobre ele, o tempo. Esse contínuo de acontecimentos e camadas que perpassa tudo, que não dominamos e para o qual parece haver cada vez menos referências para mensurar. O que sabemos, com certeza, é que ele tem muitas dimensões. Aqui, buscamos trazer algumas delas para, em clima de final de ano, provocar nossas cabeças sobre o que, afinal de contas, temos feito com o nosso tempo. 

Do ensaio de um físico que nos explica a relatividade do tempo, ao relato sobre um retiro pessoal quando se pode ser dona do próprio tempo; do quanto tempo é dinheiro na biotecnologia; do quanto nos tornamos intolerantes com aquilo que demora mais do que 30 segundos; de como o cinema mudou; a música mudou e nós mudamos. Falamos também sobre o tempo que nos exige ao limite e que usa a produtividade como motivo de orgulho e conquista; da falta de sono e da captura dos nossos sonhos; do sequestro do contexto e da sensação de estarmos um pouco desnorteados, ou fora do tempo.

É impressionante como palavras como atenção, contexto, cansaço, velocidade, aceleração, parar, demandas, urgência, paciência, esforço, produtividade, lucro, dinheiro aparecem e se repetem ao longo dos textos que reunimos nesta edição. Talvez, analisando as entrelinhas, seja possível perceber que, do jeito que está, não parece bom. O que faremos, então, para mudar quando tudo começar outra vez no dia 1º de janeiro?

Boas festas e boa leitura!

Também nesta edição
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