Escrever é algo íntimo mesmo que seja realizado no meio de uma multidão. As palavras que saem na ponta da caneta ou em cada toque no teclado percorrem um caminho interno silencioso antes de serem externadas e, mesmo quando se materializam, para que escapem do perímetro da intimidade e se tornem parte do mundo concreto, precisam encontrar um leitor. Nem sempre aquele que escreve pressupõe que suas palavras sejam lidas, mas isso não o faz menos escritor.
Escritor é quem escreve. Ainda que os seus textos nunca sejam publicados ou divulgados, não há como retirar de quem escreve o direito de ser.
A escrita diarística nos mostra o quanto independe da intenção de quem escreveu se aquele ato íntimo de colocar sua existência em palavras um dia será lido por alguém. É difícil imaginar que Anne Frank, ao descrever seu cotidiano em um esconderijo durante a perseguição do povo judeu, imaginasse que seu relato de sobrevivência se tornaria uma das obras mais lidas da história da humanidade.
Pensando a cultura contemporânea, não acho possível deixar a literatura restrita a um certo cânone. A escritora Annie Ernaux venceu o Prêmio Nobel de Literatura no ano de 2022 e, apesar de ser a primeira francesa a realizar o feito, não foi celebrada por todo o mercado literário de seu país. A questão central das críticas que recebeu se baseou em um questionamento sobre o merecimento de um Nobel por uma mulher que só escreve sobre si, uma escritora que deixa de relatar a mulher como pertencendo ao espaço privado e passa a contar suas histórias internas no espaço público.
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